Nota Introdutória
Altas horas já passadas, e a tasca do
comerciante continuava a servir de hospedagem aos bem-falantes aeronáuticos.
Estavam pousados nas cercanias do Cine
Chikapa, naquela avenida onde se
situava a pastelaria Bonina, a D.G.S., a J.A.E.A….Lá bem nos limites ocidentais
da cidade Saurimense.
Mas… o “Marrador” vai colocar os personagens
em plena sessão… Tomem gosto pela conversa fiada dos “gabirus”!...
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Marrador – Depois do “marufo”
entornado, da “tapioca” comida, e
fumada a “liambada” na tasca do “fardex”, eis que os nossos leõezinhos
ressonavam sem rosnar. Tão aéreos, tão apáticos, caíram de cú nas
palhinhas…mesmo à beirinha da sanzala!... E, agradecendo ao dono amigo, a bela
estadia…partiram para outras explorações, aproveitando a “pikada” sanzaleira já muito conhecida pela velha tropa dos
“zingarelhos”. Escutem-lhes a canção, o lenga-lenga acostumado deste duo
atribulado.
JOCA – E a “catchipembe”
matava ratazanas!...
VITO – Hummm!...Este paladar na língua!... Seria da “liamba” mal curada?! Ou, da “mutopa” entupida?!...
JOCA – Entupido ando eu. Preciso “genisticar” o órgão. Senão, ainda
rebento.
VITO – Com o teu “béu-béu” estás a dar-me ideias!...E se fôssemos
até à Barragem do nosso amigalhaço Capelão?
JOCA - Pelo circuito da Sanzala de S. José?
VITO – Pela rota acostumada – cubata
do Soba, para sabermos novidades da aldeia, pelo bananal, para a fotografia habitual, pelo rio, para apreciar as “mwanas phwos” e para mirar as provas
olímpicas de mergulho, pelo centro das palhotas, para escolher os “cafécos” e ver a malhação no “pirão”.
JOCA – Já a tinhas estudado!... Estou a ver-te nos
precipícios…Primeiro, na “cubata” do
“muatan” para dissipar as calorias.
Segundo, foto no bananal, para dizeres onde estiveste, armado em garanhão.
Lavadeiras, com os “nés-nés” ao léu…, malhação do “pilão”?! Esta, não estou a
situar?!
VITO – No pirão. És gago? Trocas os “L” pelos “R”? Será ainda o
efeito do “malufo”? E as provas
olímpicas, esqueceste de referi-las?!...
JOCA – Pois, enganei-me,
queria exprimir a passagem de modelos com os “cafécos” de tanguinha!... Ou, sem ela!...
VITO – Com estas maldades todas, mentes turvas, acabamos por nos termos
que confessar na Barragem!...
JOCA – Não. Lá não há confessionário. Só carrossel, baloiço
eléctrico, jangada a vapor e formiguinhas de asa nos morros de sete andares. Estância
balnear!...
Marrador – Os “ papa – léguas” caminhavam para o Norte. Passaram junto ao cemitério da cidade, tiraram a foto da praxe junto à grande bananeira – limite fronteiriço da sanzala e que dava para o desfiladeiro da Barragem. Antes, beijaram a mão ao grande “soba”, na cubata mor, fotografaram os “cafécos” e “cafécas”, e refrescaram os pés junto às lavadeiras do ngiji. Deitaram as suas graças às “tusulas”, e prosseguiram atalho até à dita Barragem construída pelas mãos do grande engenhocas religioso.
JOCA – Oihhh…Já avisto os
“corvos” no balancé!...
VITO – É o Capelão, e gente da
nossa “guerra” juntamente com os “cambutas”.
Está tudo numa animação desgarrada. A Barragem sempre produz energia! Até oiço
música de grafonola!...
JOCA – São as “kai” a
balirem.
VITO – Cabras?! Aqui?
JOCA – E, são brancas.
VITO – Bem, estão com o Capelão…Estão isentas de pecados!...Vamos
lá a ver se existem umas “bjecas”
frescas!...
JOCA – Se há “corrente”…há energia. Se há energia, há geladeira. Se
há geladeira, há bebida…
VITO – Se há, há…Se há, há!... Conversa de “chacha”!...
JOCA – Gaita!... Se não houver, tens a frescura dos morros das formigas. Cura-te. Vês o
carrossel a girar? Afinal, temos o inventor “pardal” em África. Canal de água,
Barragem, turbinas a funcionarem, produção de energia, luzes acesas, e
divertimento para a pequenada. Sim senhor!...
VITO – Tira aqui umas fotos para enviarmos à “famelga”.
JOCA – Aqui, junto ao canal. Aqui, junto aos morros ou, com o Capelão como companhia, e também no “citulu” “apalhadado”.
Marrador – Depois de uma
alongada com o “genérico” Capelão, soldadesca espacial e,canhikas” da cor de breu, eis que os veraneantes de fim-de-semana
se colocam por discernir sobre a nova etapa a palmilhar. E, porque parar é
morrer, havia que dar novo rumo ao dia…“
JOCA – Tal e qual o
combinado, seguiremos até à piscina. N´est-ce pas?
VITO – Ohhh…Ouiiii!... Les petites filles sont belles !...
JOCA – Hummmm….Estás a imaginar já as meninas do Liceu a nadarem na
piscina?
VITO – Circundamos o
Liceu, torneamos a Capela, encetamos pela Avenida
das Mangueiras, Campo da Bola, e penetramos, penetramos, pelos bambus.
JOCA – Penetraremos. Penetraremos na caminhada triunfal!... Mas, no
túnel, no túnel dos bambus…consta que há lobos maus?!...
UUUhhh…
VITO – Só papam meninas solitárias!...
JOCA – Esses lobos, conheço-os eu!... Alguns até andam fardados!...
VITO – Juízo na tola..Vê lá!…Acabaste de receber um alqueire de
catequese com o Tenente Capelão e não te emendaste?
JOCA – OK. OK… Só natação!... Nadar, nadar. “Kha”!... Já não falo mais!...
Marrador – Bambus, só
bambus!... Terminada a avenida das Mangueiras, entrava-se na arcada das canas
grossas. Todos os “franganitos voadores” tiravam a sua foto nestas paragens. Aqui,
e junto à estátua do grande sertanejo, defronte à Capela. Deixemo-los caminhar
para a fonte refrescante…
JOCA – Há dias passei por estas bandas com duas “canhicas” minhas
conhecidas do teatro.
VITO – E…e….?
JOCA – E tínhamos ido tomar banho ao rio. Fazer um picnic à nossa
maneira.
VITO – E… e….?
JOCA – E, ensaiámos a peça teatral!...
VITO – Até os crocodilos do rio cantaram em coro, certamente!...
JOCA – Mudando de tema, eis aqui à nossa frente a “turbe” dos asas
caídas. Uma vintena a fazer das suas
palhaçadas!.... A nossa tropa anima toda a cidade.
VITO – Olha, olha-me para
aquele mergulhador! Melhor do que os “matumbitos” do riacho. Olímpico em Munique.
Tal e qual o Mark Spitz,
Tal e qual o Mark Spitz,
JOCA – O das medalhas? Não tanto, mas também dá nas vistas!...
VITO – E, os dois do escorrega? Quem são?
JOCA - Sei lá!... Estão a alisar o zinco, tirar as farpas ao
estrado. Não sabem nadar, e estão no disfarce!...
VITO – Outro mergulhador, classe!... Só competências para as
meninas verem!...
JOCA – Peneirice azulada!... Não, aquele não é azul . Aquele é
verde.
JOCA – Arre!...
JOCA – Já topei. Estão a
fazer que estudam, mas sempre a olharem para o “despe-despe”.
VITO – Calma. Respeita a Terezinha e a Suzete. São filhas da nossa
“sargenteada”!... E, não só!
JOCA – Sim, a paisagem neste filme é superior à das quedas do
Chikapa. Lá, só há barbudos!...
VITO – Muitos namoros se iniciam aqui!... Água morninha, tardes
alongadas, caminhada pelo arvoredo,…tudo no compasso certo!...
JOCA – Joga a experiência
já vivida, no fim de comissão!... Sempre os mesmos lugares já pisados tantas
vezes!...
Marrador – Mais uma tarde que os nossos convivas passaram na piscina,
juntamente com tantos outros companheiros de guerra, e pelas cidadãs da nobre
cidade de Saurimo. Sempre os mesmos circuitos, sempre a mesma conversa, sempre
os mesmos acepipes!.... Ao longo de vinte e tantos meses ou, mais!....
Envelhecia-se lentamente, amadurecia-se e,….Desfrutava-se ….Quando alguém o
permitia!...
E, AGORA?!...
- Onde
está o nosso Cabo
- Esse
bravo do passado
- Da heróica
aviação?!
- Que até
com fato emprestado
- Parecia
Homem honrado
Língua Quioca
Canhika – jovem
Marufo – vinho feito da fermentação da seiva da palmeira
Malufo – vinho
Tapioca – papa de farinha de mandioca granulada e doce
Catchipembe – aguardente
Liamba – tabaco
Mutopa – cachimbo de água
Muatan – senhor
Pikada – caminho africano de 3ª. categoria
Tusula – rapariga
Kai – cabra do mato
Ngiji – rio
Citulu – chapéu
Mwana phwo – lavadeira
Kha – não
Bitacaia – parasita dos pés
Cubata – palhota
Cafécos – jovens
Kambuta – pequeno
Bjeca – cerveja
Matumbo – inculto
Anotações:
Teresinha – Jovem cidadã da cidade
Suzete – Filha de Sargento da FAP
Fotografias:
Recolha no “nosso” Blogue
Versos:
Fado do Especialista – Versos enviados por Álvaro de Jesus
Estamos no dia 08.09.2013, quarenta e poucos anos depois destas vivências, e sabe-nos bem ler, recordando outras que tais...
ResponderEliminarSim! Muito se viveu, de tal sorte que, vencidos todos estes anos, nada se olvidou...
E é bom saber que, pelos menos, a D. Alzheimer ainda não nos privou de recordar tudo o que, em tempos de missão e juventude, por terras de uma Saurimo nunca esquecida, fomos vivendo e saboreando...
Saudade e Honra aos que já regressaram a Pátria da Verdade.
Para todos os que por aqui vão rodando, os Abraços de sempre, no mesmo espírito e camaradagem!
Álvaro de Jesus
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