sexta-feira, 28 de março de 2014

OS GALINÁCIOS


Quando ia destacado para Gago Coutinho, levava normalmente um “suplemento alimentar”, à base de muitas latas de conservas e fruta enlatada, e a razão era bem simples, a comida para a arraia miúda era “confeccionada” pelo Batalhão do Exército, numa cozinha igual à de todos os outros quartéis espalhados pelo Leste de Angola, um telheiro negro do fumo, com um buraco no chão onde introduziam a lenha, por baixo da “baixela” onde inventavam todos os dias as receitas que aniquilavam qualquer tentativa de dar aos alimentos a simples função de  alimentar o pessoal.
O refeitório
De salientar que mesmo não havendo condições para comermos nas nossas instalações, (os pilotos comiam na messe de Oficiais do Batalhão), os especialistas, improvisaram mesa e cadeiras e comiam no hangar só para não passarem por mais essa humilhação de terem que ir comer ao outro lado, com: hora marcada, formatura, cornetada, e outras regalias proporcionadas aos praças do Exército. Não que não comêssemos a mesma sopa desenxabida, e o prato principal que muitas vezes nem conseguíamos identificar, a mesma fruta de terceira ou quarta escolha, para não falar do célebre vinho de pipa, que se fosse analisado, denunciaria todas as adulterações sofridas desde as berças Continentais onde o envasilharam, sem saber qual seria o destinatário, passando por todos os intermediários, até chegar aos confins da savana.
Vem tudo isto a propósito, da fominha que se passava nos destacamentos, por vezes tão intensa, que não nos deixava pensar noutra coisa que não fosse em comida, a sério, daquela que as nossas mães faziam e a que a gente nem ligava, fartos, de barriga cheia, mas que aqui até quase morríamos de saudade.
Num desses períodos de “avareza” em que a comida andava tão má que até slides merecia, não morresse-mos todos envenenados e ninguém adivinhasse o porquê, resolvi “instigar” os MMA’s e os Pilotos uma vez que eram eles que faziam o abastecimento de frescos aos destacamentos dependentes do Batalhão de Gago Coutinho, para que confiscássemos alguma coisa decente e tenra, onde pudesse-mos ferrar o dente. 
DO 27 preparando a saída
Numa terça-feira, depois do Nord ter descarregado tudo e descolado, o nosso DO, começou a efectuar os abastecimentos de frescos e correio. 
Como combinado com eles, escondi-me no compartimento junto com a carga, e assim que descolámos, saquei da faca de mato, e abri o enorme saco de plástico cheio de frangos, que a viagem era curta, e peguei um frango pelas patas, para o transferir para o nosso saco, o frango estava prezo com os outros e eu fui exercendo cada vez mais força para o separar e retirar do interior do saco, eis senão quando dou comigo com as patas do frango na mão, concluindo para meu espanto, que os frangos estavam “tão frescos” que mesmo crus os ossos das coxas se separaram da carne, estavam roxos assim como os orifícios deixados pelo esforço que exercera. Voltei a enfiar os ossos nos orifícios, atei os sacos, e “confisquei” uma data de caixas de rações de combate, que escondi por diversos sítios do compartimento de carga, essas pelo menos, podiam ser ingeridas sem mais acidentes.
Na volta quando toda a gente já afiava o dente paro o churrasco, fizemos um refeição de “carnes (latas) frias” e guardámos a vontade de comer para melhores tempos, ou quando nos fosse permitido ir à caça.

Gago Coutinho, 12/1972
OPC ACO

quinta-feira, 20 de março de 2014

BASE AÉREA DA OTA

O QUE SE ESCREVEU EM 1940


Inaugurou-se no dia 14 de Abril do corrente ano de 1940, a Base Aérea nº2, magnificamente instalada em vastos terrenos a Ota, cerca de Alenquer. É uma obra grandiosa e única no seu género em Portugal, sobretudo no que diz respeito ao aquartelamento. Constitui com os seus edifícios e as suas oficinas, um estabelecimento militar de primeira categoria, amplo, limpo, banhado de luz e possuindo acomodações para 150 homens e 60 aviões.   
Na nova unidade da aviação distinguem-se a parte de comando e aquartelamentos e a de aeronáutica propriamente dita. Na primeira, ficam quatro alas distintas mas edificadas de modo igual. Passada a porta de armas que tem anexas duas pequenas casas -uma para a guarda e outra servindo de prisão- vê-se `esquerda a primeira construção que é a “messe” de oficiais. Consta de: um “hall” de boas dimensões+, adaptado a sala de estar; balneários de sistema moderno; uma cozinha forrada a mármore e com o respectivo fogão; uma esplêndida sala de jantar, um bar pequenino; uma sala de leitura e outra de visitas. Para os oficiais solteiros há vinte e um quartos, dispostos ao longo do corredor.
No corpo do edifício fronteiro estão instalados o comando, a secretaria, o gabinete do oficial de serviço, a biblioteca, uma de conferências, onde se encontra um valioso friso fotográfico que foca as diversas fases do desenvolvimento da aviação militar em Portugal. À entrada, dois belos azulejos fixam uma parede gloriosa da viagem ao Brasil, de Gago Coutinho e Sacadura Cabral e a chegada do primeiro avião português, há anos a uma das nossas colónias do Ultramar.
As acomodações para os soldados, na ala que lhe é destinada, são esplêndidas e modernas. Amplos dormitórios, correspondendo a cada cama um belo armário com cabides. Balneário, também servido por água quente fria. Uma boa sala de jantar com mesas de ferro e tampos de mármore branco, tendo cada praça a sua cadeira de ferro.
Uma sala enorme com inúmeras janelas é exclusivamente destinada ao curso de instrução primária.Temos, depois o edifício dos sargentos, igual aos anteriores, onde também ficam a cozinha privativa, a sala de jantar, os balneários e os refeitórios.
A Sul e Norte do aquartelamento e, consequentemente, fora dele, estendem-se dois bairros, tudo casas alegres, cheias de sol. Destinam-se estes bairros aos oficiais e sargentos casados. O dos primeiros é o do Sul. Dezanove edifícios com dois andares, espaçosos, de linhas elegantes.
O bairro dos sargentos fica ao Norte e constituem-no vinte e oito construções, compostas de rés-do-chão e um andar.

Afastados algumas centenas de metros dos edifícios de aquartelamento e comando, encontra-se o conjunto de “hangares” e oficinas. Logo em frente, estende-se a pista, que é um grande quadrilátero alongado no sentido Norte-Sul.
Os gigantescos “hangares”, cuja grandiosidade só se pode avaliar bem quando neles se penetra, estão repletos de material aeronáutico, desde grandes aviões de bombardeamento até às mínimas peças acessórias, incluindo os “caças” e os aparelhos de treino.
Não faltam, também, as patrulhas de “caças” de protecção não só da própria unidade como dos bombardeiros trimotores e bimotores com que o nosso Exercito do Ar foi recentemente enriquecido.
São três grupos de “hangares” de que a nova base dispõe: um de Montagem e esquadrilha de caça e dois para bombardeiros completamente metálicos. Ao lado do primeiro ficam os armazéns com material de substituição e, em edifícios anexos, as oficinas apetrechadas com a mais variada maquinaria para reparações.

Numa dependência reparam-se e ensaiam-se motores; noutra regulam-se aparelhos de precisão. Em várias secções trabalha-se nas diversas matérias-primas que compõem a complicada estrutura de um aeroplano.
O pessoal goza também de todas as comodidades. O director das oficinas tem o seu gabinete e uma secretaria para os serviços respectivos. Os artífices dispõem de vestuário higiénico e dum refeitório amplo.
Em arrecadações devidamente protegidas está armazenado o material destinado à actividade bélica dos aviões de bombardeamento.
O serviço de abastecimento dos aparelhos é feito por tanques gigantescos, com a capacidade para 50.000 litros cada, enterrados e protegidos contra ataques aéreos.Para a limpeza está instalado um motor de ar comprimido, ligado por uma rede de tubos que pode chegar onde se encontre o material.
Viaturas automóveis, pesadas e ligeiras, asseguram os serviços de transporte e sanitário, prontos à primeira chamada, nas espaçosas garagens edificadas ao cimo do recinto dos aquartelamentos.
Esta magnifica obra do Estado Novo que, como já dissemos, é no seu género, a melhor e Portugal, e importou em cerca de dezoito mil contos.

Por:








sexta-feira, 14 de março de 2014

CONVERSAS NA CIDADE Nº.8

AS TRÊS TORRES
Nota Introdutória
No princípio era o “Verbo”, e o verbo estava com as Torres de Controlo, e uma das Torres era a nossa Deusa “Majestosa” – símbolo máximo do A.B.4.
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Marrador – Neste texto vamos apresentar a família “Torres”. A avó, a mãe e a filha. Cada uma com a sua história peculiar fixada no tempo, como se de uma verdadeira família humana se tratasse. A velhinha, a bonitona e a bebé. A primeira, nasceu há longos anos!...
Vamos conversar com ela…,…
VITO – Minha menina, qual é a sua “graça”?
GUIDA – Neste futuro e já afamado A.B.4, deram-me o nome de Guida. Mas como ainda sou uma criancinha, tratam-me por Guidinha.
VITO – Em que ano nasceste, Guidinha?
GUIDA – Em Novembro de 1962 e fui instalada com base na minha mobilidade precoce.
VITO – “Andor”, minha pombinha bailarina!...Quem foi o teu papá? 

GUIDA – Dizem as más-línguas que foi o Bem-Haja, um dos pioneiros do A.B.4. Cansou-me tanto com as andanças pelas pistas que aprendi a correr logo que vim ao Mundo.
VITO – E o teu avô?
GUIDA – O Capitão Trovão a quem chamam de Horta.
VITO – Horta? Horta de couve ou, horta do Faial?
GUIDA – Isso não está sob o meu controlo. Só controlo passarinhos…
VITO – Passarinhos!... Que passarinho primeiro te saiu na rifa?
GUIDA – Olha! Um Pê Vê. Um daqueles que mais parecia um vira latas da 2ª. Guerra Mundial ou, da Coreia!... Tinha um “berlinde” na crosta para se guiar pelas estrelas. No ar, parecia um navio de guerra!...
VITO – Sentias DO dos passarinhos?
GUIDA – Essas DO´s a quem apelidavam de 27, só apareceram em 1963. Pareciam umas “coquetes” a esvoaçarem de Destacamento em Destacamento. Por essas bandas fora, não tinham as minhas manas para falarem. Borboletas!...
VITO – Com as borboletas não se lhes juntaram uns gafanhotos, também?GUIDA – Sim, em Abril desse ano chegaram letras e algarismos… Tiveram o cognome de T-6. Grandes máquinas de guerra!...
VITO – Assististe a tudo, ou seja, viste nascer o Verbo”!...
GUIDA – OVerbo”!... Eu era a Torre Móvel, eu era o Radar, eu era a Casa de Campo!...
VITO – Tipo capoeira andante!... Como “verbo”, o que vias em teu redor?
GUIDA – Via, via o pessoal a trabalhar na construção deste AB. Dormiam no edifício das “Infras” e comiam na casa do Vítor Sá. Eu, circulava, circulava e via tudo. Via barracas e tendas e via a minha filha a ser construída, mas o controlo era feito em cima de mim. E, eu, caminhava, caminhava e, por isso me apelidaram de Móvel
Marrador: No princípio era oVerbo”, e o verbo nasceu assim!...Havia uma pista de laterite que servia a DTA e continha um estacionamento para viaturas junto da aerogare de alvenaria. Existia uma pista já aberta e em processo de asfaltagem que viria a ser a pista do A.B.4. O pessoal das infraestruturas esfolava-se a trabalhar e, os primeiros aviões a visitarem este aeródromo foram os PV-2, DO´s e T-6. Em 1963 deram-se os fogos reais já com o Com. Agrup 11. Foram os T-6 que nos treinos das guarnições ajudaram a definir rotas de aproximação. Tiraram-se no ar fotos das posições a bordo dum T-6 e, na altura dos ditos fogos, já havia a Torre fixa no A.B.4, próxima aos vizinhos dois T-6 e um PV-2 que participaram numa das sessões de fogos AA. Respeitante a esta Torre- (a filha da mãe) – deixem a conversa para o VITO.
VITO – Que linda “Majestosa” me saíste, pomposa Torre!... Tua mãe Guida foi a tua briosa.
E o teu pai, algum sanzaleiro?
MAJESTOSA – Meu pai, foi o capitão que vagueava pelo “Quimbo”!...
VITO – Nasceste ainda a tua mãezinha era uma criança, “matumbinha”!...Violação logo à nascença?!
Majestosas – Havia pressas!...Os combates estavam para ribombar. O reboliço impunha a “cobrição” da guerra!...
VITO – A Guidinha deixou o andarilho e, tu subiste até aos vinte e cinco metros. Comeste muita “fubinha”!...Majestosa estática, bela raça!...Atravessada de “Black & White”, és rija que nem uma pera. Aposto que durarás por décadas!...
MAJESTOSA – Aguentei guerras infinitas e ainda me mantenho de pé. Flexível, mas sólida e resistente ao tempo. Velhinha, e já visualizo a minha filhinha ao meu lado a dar os primeiros passos!...
VITO – Tens muitas histórias contidas nessa memória, adivinho.
MAJESTOSA – Tantas, tantas como reais e fictícias. Lendas e cruéis, bonitas e aventureiras. Mas…já as contei tantas vezes que os meus “residentes” estão fartos de as ouvirem!...
VITO – Aqueles que adormeciam no teu colo quando deveriam controlar o tráfego aéreo?! Os faroleiros do ar?!...
MAJESTOSA – Sim, esses bêbedos e sorvedores de “nocais” e “cucas”. Dorminhocos de maca e comedores de chouriça do “puto”. Por isso, é que tenho a minha sala de estar a cheirar a bafio!...
VITO – Conta, conta as tuas histórias para os velhotes recordarem como se fossem criancinhas inocentes.
MAJESTOSA – Tantas, tantas, que só te darei uns tópicos. Vitinho meu, lembras-te do teu primeiro cagaço? Tu que estás aqui armado aos cucos com as tuas perguntas…não te lembras do teu 1º. dia nesta tua Majestosa? À noitinha tiveste um pesadelo com os “turras” a assaltarem-te a gaiola. Cobardolas!... Recordas o roncar do tal avião fantasma que nos sobrevoou e abanou pela calada da noite? E os Ovnis que disseste que viste e, não viste ou, viste? Já zingavas por todos os cantos que até desceste pelo para raios num dia de trovoada. “Corrécio”, maltrapilho que até tremeste como varas verdes ao saberes que um Boeing iria aterrar no A.B.4. Meteste-te debaixo dos equipamentos a fingires que não tinhas fonia!... Só “caguefes”!...Só lias livros de “cowboyada” nas horas de ponta que nem viste o T-6 do Corredeira a sair da “auto-estrada” com uma poeirada, tipo Formula 1. Até a DO do Alex quis aterrar na tua careca fazendo escadinhas no ar. Malandreco dum raio!... Para te despedires da tua “catraia”, o teu substituto na Torre ia causando um choque aéreo. Olha, que sarilhos, meu fala-barato!... E nos dias de trovoada?! Acoitavas-te no seio das minhas entranhas cagadinho de medo, medricas!... Enfim, eu só servia de escritório para escreveres as tuas cartinhas para as meninas do “puto”, feito valentão!...
VITO – Gaita, não se pode falar contigo. Descartas tudo para cima dos “controlas”!...
MAJESTOSA – E, ainda não acabei…meu “magarefe”. Escapaste-te de levares umas porradas do capitão “gancho”. Desenroscavas as lâmpadas do tecto para dormires mais tranquilo, anh!...
VITO – Oh minha pombinha linda, estavam fundidas com o teu abanar constante. A tua carcaça só bailava ao sabor do vento!...
MAJESTOSA – Aldrabão. E os equipamentos? Baixavas-lhes o som para não te
incomodarem e, um dos mesmos ficava sintonizado no batuque dos merengues!... Eu bem ouvia o piloto Pinheiro todo aflito a chamar por ti lá para os lados de Gago Coutinho. Coitado, amedrontado com toneladas de nuvens a mijarem-lhe em cima e com um fogo-de-santelmo a lamberem-lhe as asas do “teco-teco”, e tu a ríres-te despregadamente.
VITO – “Atão”, chamei Luanda!...
MAJESTOSA – Chamaste Luanda ou, a Rosa? Seu capador de flautas!...Ligrinhas.
VITO – Hoje acordaste com dores na garganta. Estás a ficar rouca de tanta asneirada.
MAJESTOSA – Se não dormi foi porque te deu para apanhares borboletas às tantas da madrugada. Sempre com o holofote ligado para as cegares e, eu, às moscas!...Depois, como pisaste as formigas cadáveres trouxeste para o meu soalho aquele cheiro a podre. A tua rendição só comentava: “Porra, esta Torre anda podre”!...Pois, eu é que me tinha cagado, claro!...
VITO – Bem, havia pior do que eu, certamente!
MAJESTOSA – Havia, havia aquele que só se embebedou uma única vez, mas que durou dois anos. Era ele e o Cossa da Meteorologia. Descia pela varão do para raios feito bombeiro. Depois, pensando que tinha lá em baixo, encostado às minhas pernas o cavalo, montava na “kinga” e começava a relinchar seguindo para o Bar dos “sorjas”.
VITO – “Cum caraças”. És cá uma “cusca” maldosa! Vê lá se não transmites esse veneno todo à tua filha Deolinda. Pela tua barriga, estás prestes a desovar!...
MAJESTOSA – Teria muito para contar… Ainda me lembro de quando estavas a vazar as tuas águas lá do topo da minha garupa. O Comandante seguia no seu Volkswagen preto, e teve que ligar o limpa vidros, interrogando-se donde é que se situavam as nuvens num dia a descoberto. Faziam da Majestosa uma discoteca a céu aberto. Tudo vosso!...
Marrador – Meus caros leitores, não se excitem com a conversa desta venenosa pois, nem tudo foi verdade…Só as questões piores! Agora, passamos à terceira Torre – a filha da Majestosa, neta da Guida.
Vive junto à sua mãezinha na presente data.
VITODeolinda, minha pequenina. Nasceste há pouco tempo, mas já és tão grande!...
LINDA – Quem és tu, meu “matumbo”?
VITO – Sou o “controla” dos brancos. Tua mãe não te falou de mim?
LINDA – Olha-me este “xacala”, o “samuto” do “puto”!...Ainda és vivo, pacaça?
VITO – Cangalho velho é a tua mãe e ainda não caiu!
LINDA – Pensas que ainda tens “gungungo”, sua próstata entupida? Já olhaste para a tua sombra?
VITO – Olha, olha, eu que pensava que a Majestosa ensinava a filha a ter boas maneiras!...Camafeu danada! Estás armada em senhora dos ares a controlares os gafanhotos “dos brazuca”?
LINDA – Já vi que ainda andas “malufado”. “Tweia kuno”. Sobe o elevador e saúda-me com um “Moyo weno”, à maneira quiouca.
VITO – Assim já gosto do teu falar, minha “tchenge”. Aprecio deveras as “tusulas” deste Condado. Ehhh pá, ehhhh pá!... Vestiste o teu “quitengue” domingueiro? “kukuata” a minha ofensa de há momentos!...
LINDA – Os “lungas” de outrora pertencem ao passado. A guerra terminou e, os tempos são outros, agora.
VITO – “Kusakwila”. Acabemos com os “kukongas” de mal dizer.
LINDA – Vês a minha “koi-koi” junto de mim? Aquela que te serviu de poleiro? Sempre reguila, mas boa mãe!
VITO – Ensinou-te as boas maneiras? Sofredora de tantas guerras!... E tu, jovem e encantadora Torre, como te tens dado nestes tempos de Paz?
LINDA – “Sepa liami”, os tempos são outros. Estamos no bom caminho. Já se construíram novas instalações neste velho aeródromo e, por aqui se transacionam as “kamanguitas”!... A par das novas modernices, caem as velhas e históricas construções.
VITO – Pois, o hangar já se avista sem telhas, a tua mãe já torta e cega. As Messes…ao Deus dará, e os morais do Clube dos Especialistas?
LINDA – “Zungo”, não digas nada. Vão servir como painéis nos corredores do novo aeroporto!...Relíquias do passado, pinturas de celebridades!...
VITO – Hummm!... “picada” asfaltada até à capital, “pó pós” à maneira. “Matumbos”… mais cultos!...
LINDA – Tudo vai rolando. Muitos “canhicas” falam do pai branco com certa nostalgia!... Escrevam umas cartitas e organizem uma excursão para verem a cidade de Saurimo, cada um por si. Eu, com a minha mãe “A Majestosa”, daremos as boas vindas aos “Especiais” do A.B.4. Faremos uma grande festa com “malufo”, “catchipembe”, “maconha” no “mutopa”. “Pwos” à fartazana, “gomas tchinguvos” a batucar, maningue de “tusulas” “nu cafena”, e “funge” para comer!...
Nos finais… a celebérrima “IACAMOKA” para reatar as pazes eternas entre os guerreiros de ambas as partes. Fiquem-se com os versos dum piloto que se inspirou lá para as serras de Montesinho!...

“MOYO UÉ, TWEIA KUNO”, com “GUNGUNGO”!...


VOZES AMIGAS

Ouço as vozes tão perto e tão distantes,
Que me chegam repletas de amizade,
A despertar em mim uma saudade
Cujo pungir eu não sentia antes.

Batem os corações mais anelantes,
Que aliviam minha alma em ansiedade,
E suavizam a dura soledade,
Em noites preguiçosas, fatigantes.

E pra além da distância no espaço
Acompanha-me sempre o vosso abraço
Refeito de calor e simpatia.

Ó amigos que amo e compreendo!
Também eu, tantas vezes, vos relembro
Em horas de tristeza e alegria.
  
Língua Quioca
Matumbo – inculto                                                                                                                               
Fuba – farinha de mandioca
Xacala – grande chefe
Samuto – homem
Gungungo – com força, cheio de energia
Malufado – embriagado
Tweia kuno – vem cá, chega aqui
Moyo weno – saudação respeitosa
Tchenge – mulher bonita
Tusula – rapariga
Quitengue – pano colorido
Kukuata – desculpa
Lunga – homem
Kusakwila – obrigado
Kukonga – disparate, ditotes
Koi-koi – velha
Sepa liami – meu amigo
Kamanga – diamante
Zungo – cala-te
Canhica – criança
Catchipembe – aguardente
Maconha – liamba, tabaco
Mutopa – cachimbo de água
Pwo – mulher
Goma tchinguvo – tambor
Nu cafena – dançar
Funge – farinha cozida
Iakamoka – grito de guerra
Kinga - bicicleta
Recolha histórica:
Manuel Flórido Bem-Haja e Mário Arteiro
Fotografias:
Recolha no “nosso” Blogue
Versos:
Pil. Júlio Corredeira

Até Breve
O Amigo