quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

A AMIZADE E IRONIA SATÍRICA, A UM "JOVEM" AGRICULTOR !


2022 "Annus horrible" para o agricultor Esteves!
Aquele rapaz jovial MMA da linha da frente no AB4 e do Luso que se fartava de fazer destacamentos no Cazombo, Cuito Canaval e Gago Coutinho em 1972 até fins de 1974 conhecido por João Esteves, está a passar por um ano agrícola cheio de dissabores que o têm desanimado, pois também é agricultor.
Quando findou a sua prestação na FAP, o João, pela mão de um cunhado, abraçou a arte de caixeiro-viajante e começou na então famosa Tulipa Negra onde percorria o médio e norte do país com predominância em Trás os Montes.
Vendia artigos de decoração tão procurados à época, como faianças, casquinhas, pratas, estanhes, alabastros, cristais e produtos novidade.
O Esteves teve sucesso, adquiriu um duplex no Porto e um terreno agrícola para os lados de Chaves. Este terreno não nivelado, semiabandonado, tinha já algumas oliveiras e  de fruta bichadas. Mandou arrasar socalcos, arrotear terras e plantar dezenas de oliveiras e amendoeiras, tendo prontamente adquirido terrenos contíguos.
A pequena casa de apoio existente que tinha sido um lagar de azeite, otimizou-a e, sem destruir vestígios antigos e funcionais, arquitetou uma casa moderna para toda a família. Construiu também uma piscina de dimensões apreciadas com água corrente e jardins de apoio que, com uma periodicidade anual, nos presenteia com um almoço salutar.
A atividade agrícola é um part time. Ele ainda não deixou de praticar as tarefas que lhe dão o maior gozo. Jogou andebol até aos 50, onde foi cotado como magnífico atleta. Praticou ténis até aos 69 anos, não sei se teve de abdicar por grave lesão num joelho, ou por varizes. Foi campeão nacional de ténis na classe dos moribundos. Aquele Esteves folgazão que conhecemos já acabou, foi há 3 anos em Madrid, num arraial noturno, fraquejou e deixou-o inibido.

O João tem agora 70 anos e todos os dias pega na mala que já não é de madeira e vai visitar os fregueses, agora com acompanhamento ligado às novas tecnologias. Continua a vender produtos de decoração espanhola e italiana, onde tem de se deslocar amiúde, para se atualizar e acompanhar clientes. Vende mesas, cadeiras muito modernas, escaparates, espelhos e novidades. Como ele só tem 70 anos ainda tem mais 15 anos para trabalhar até à reforma final.
No seu projeto agrário tentou aproveitar a potencialidade da região que é sobretudo a exploração do azeite e amêndoa, preterindo a vinha. A vinha foi a primeira a arrancar, pois o seu feitor, que é também enólogo, regente agrícola, o tipo faz tudo, achou que a Quinta tinha demasiadas variedades de castas e nunca poderia produzir um "Terroir" digno desse nome.
Para consumo próprio 
o Esteves compra ao Gilberto o vinho já engarrafado, produzido com uvas produzidas na aldeia. Ao plantar novas oliveiras e amendoeiras procurou incluir os novos processos de rentabilidade e qualidade do produto que queria comercializar. Aumentou o processo de drenagem e extração e recolha de água, instalou sistemas de rega tipo gota a gota, com central de pressão na rede, leitura permanente da humidade dos solos, distribuição do caudal de água computadorizada conforme as necessidades pontuais e o eventual lançamento na rede de substrato.


Tudo corria na perfeição com a previsão atestada pelo 
estado da floração, mas chegou o ano de 2022.
Nós, os leigos, que não percebemos nada de agricultura, já tínhamos tomado da situação alarmante de falta de chuva no Outono e Inverno, o que não augurava nada de bom para as culturas. O Esteves, também de sobrenome Deus, não teve sorte e Ele não lhe valeu. O primeiro aviso foi dado pela pequena produção das cerejas, figos e ameixas cujos bandos famintos de melros e estorninhos se anteciparam à miserável colheita. Nas oliveiras e amendoeiras a falta água mirrou os frutos, mesmo com tratamento fito sanitário, apareceram as doenças e quedas de frutos.
O Esteves que faz o favor de ser nosso amigo e nos acompanhar nas sextas feiras, já não é o mesmo. Aquele cabelo outrora ralo e alinhado deu lugar a uma trunfa rebelde. O bigode farfalhudo, que era a sua imagem de marca, perdeu o vigor e agora parece um pincel de barba com metade das ardas. O próprio nariz, em tempos altivo, parece mais e assemelha-se ao apaga velas usadas nas igrejas.
Este estado de coisas preocupam os amigos de sexta-feira e lembramo-nos de pedir ajuda aos nossos amigos alfacinhas, para rentabilizar aquela máquina que comprou para descasque de amêndoa, que este ano vai estar parada.
A máquina, adquirida a um artesão de Mogadouro, possui já requintes de 
modernidade com uma ligeira afinação ou ajustes, pode descascar pevides de abóbora, um entretenimento obrigatório dos fanáticos do futebol, sobretudo quando o clube do coração está a perder. Como a máquina tem uma altíssima produção é necessário assegurar uma logística eficaz e flexível, mas não só. É obrigatório um armazém, licenciamento, higiene alimentar, embalagem e comercialização.
Pomos à consideração dos nossos amigos a possibilidade de alguém começar com esta indústria pioneira que pode transpor fronteiras. Senão for possível, só podemos desejar ao João Esteves um ano 2023 mais favorável.






TONETA, Dezembro de 2022

quinta-feira, 22 de dezembro de 2022

MILAGRES DE NATAL



Passei dois Natais em Angola, em 1971 no AB4 - Henrique de Carvalho, e em 1972 no AR - Gago Coutinho.
Com mais de 28 meses de comissão em Dezembro de 1973, sem substituto, já desesperava com a possibilidade de passar o terceiro quando chegou a mensagem com a minha substituição.
Rumei a Henrique de Carvalho onde entreguei o espólio, e embarquei para Luanda numa sexta-feira com voo marcado para a segunda-feira seguinte desta vez e finalmente para Lisboa.
Nesse dia logo de madrugada rumei aos TAM para confirmar a partida e sofri a maior desilusão, quando me informaram que o voo tinha sido adiado e remarcado para a semana seguinte, dia 22 de Dezembro de 1973. Mais tarde, vim a saber que morrera o Presidente Francês, e o avião que me viria buscar tinha seguido para França com o Marcelo Caetano e a comitiva, para as cerimónias.
Tinha gasto todo o dinheiro (Angolares) que tinha pois não queria levar nada de Angola, e agora teria que me desenrascar para comer dormir e esquecer o stress de mais uma semana de "lerpa".
Embarquei finalmente e cheguei à Portela (Figo Maduro) na madrugada de 23, colocado perante o dilema de seguir para a BA5 - Monte Real apresentar-me e não passar outro Natal com a família, ou rumar a casa passar o Natal com a família e esperar o pior por não me ter apresentado, arrisquei e segui para a BA5 onde cheguei já de dia, depois de apanhar três comboios.
Felizmente o chefe do posto de rádio era um Sargento Ajudante, que posto perante a situação me disse:- anda daí, fomos à secretaria (guia de marcha, fotos, cartão de
identificação) à secção de fardamento (fardamento, roupa de cama, alojamento) e depois de almoço, já saía pela porta de armas, rumo a casa onde cheguei finalmente, já noite alta a 24.
Meti a chave à porta e ouvi os gritos de alegria da minha Mãe e Irmãs… Só então o meu coração ateu vacilou, e dei por mim a justificar que talvez tivesse tido uma ajuda do fio com a medalha de Nossa Senhora e do Cristo Africano, ou talvez eu fosse um dos Milagres de Natal!!!


OPC/ACO - Angola - 1971/1973

quinta-feira, 15 de dezembro de 2022

PERIPÉCIAS VIVIDAS NA "MAJESTOSA"


Memórias de um passado saudoso


Quase três anos de Leste de Angola
- muitas pequenas peripécias aconteceram na Torre de Controlo, onde operei por centenas de horas, noite e dia.
Nos primeiros dias que estive de serviço e, durante o turno da noite, fiquei com receio de permanecer exposto a uma cena de invasão da Base, pelos inimigos. Situava-me num ponto estratégico e que poderia ser um bom e primeiro alvo de ataque. Vinte e cinco metros de altura, edifício de fraca estrutura, gingando por todos os lados e, nos dias de grandes trovoadas, metia respeito !...

1 - Num dos turnos nocturnos, naquelas noites silenciosas em que quase todos os militares dormiam, eu vigiava através dos vidros da cabine hexagonal. Nisto, ouvi um roncar longínquo de um avião que me parecia ser de grande envergadura. Mirei com os binóculos todo o espaço aéreo ao meu alcance e, nem uma luzinha eu avistei - mas, o barulho continuava a ouvir-se e com maior ruído. Algum avião inimigo?
O DC7F rodesiano no Negage
Chamo Luanda, peço informações sobre a possibilidade da rota daquele avião e, eis que me informam tratar-se dum quadrimotor Rodesiano que transportava gado bovino. Curioso!...o piloto não deu sinais de vida aos meus apelos pela rádio e, nem o avião tinha alguma luz visível para assinalar a sua direcção…
Vim a saber mais tarde, que periódicamente fazia voos para o Negage.

2 - Noutra ocasião, encontrava-se um companheiro meu, o Rui Silva, de serviço à Torre. Ao escurecer, notou que havia uma luz que pairava no céu, mas que teimosamente não queria fazer-se à pista!... Tentou contactar com a suposta aeronave, mas esta não dava sinais de vida. Disparou um “very light” verde, para permissão de aterragem e, a luz da aeronave continuava a circular em volta da pista sem se aperceber de qualquer intenção. Intrigado, pensando que pudesse ser algum disco voador, telefonou para o Bar de sargentos a fim de solicitar a ajuda dum outro controlador mais experiente.
Lá vou eu ter com o Rui Silva para indagar da situação.
Conclusão, houve “ilusão de óptica”, “miragem pura”.
A aeronave não existia!
Porém, já tinha sido avisado o oficial de dia, iluminado as pistas com os candeeiros a petróleo e, chamado um bombardeiro B-26, que se encontrava ocasionalmente no Luso, para ajudar no combate…

3 - Noites mortas, difíceis de passar naquela Torre e, para me entreter, sintonizava um dos rádios transmissores para ouvir música.
Outros dias, acendia o holofote para atrair as borboletas e, de madrugada, descia ao edifício anexo à Torre e, pelos corredores, pisando as mal cheirosas formigas cadáveres, injectava com formol, (cedido pelo enfermeiro Correia) certas borboletas lindíssimas, grandes e, de todas as espécies. Coleccionei cerca de 200 e, ainda hoje tenho presente dois quadros na minha sala.
Soube que uns dos fãs destes “hobbies” , era um Sargento Açoreano chamado Flores. Este, dedicava-se com paixão na apanha das borboletas e, por sinal, na altura em que se encontrava em Henrique  de Carvalho, (antes de 1971), e quando os edifícios da Base eram pintados de branco, e, não de verde claro, ele conseguiu caçar a célebre e única borboleta no Mundo - Borboleta Caveira. Por cada quadro que ele elaborava, colocava uma dessas borboletas e, remetia-o para os Açores a fim de ser vendido aos Americanos. Fez bom negócio…
4 - Outras vezes, sem ocupação, dormitava na maca que a Torre possuía porém, era preciso ter um cuidado extremo pois, o célebre Capitão Laurentino andava na nossa perseguição.
Militarista de primeira, não queria que dormíssemos e, as luzes do tecto da Torre deveriam estar sempre acesas.
A nossa sorte era que quem iniciasse a subida à Torre, a fragilidade da estrutura fazia com que estremecesse e, nós, lá em cima, apercebíamos a situação.
Noutra altura, não deu para dormir…

5 - Luanda chamava, chamava…e, alertou para o facto de haver possibilidade da Base de Henrique de Carvalho se tornar alternativa para voos que se destinavam à capital. Luanda estava cercada de nevoeiro e, a pista do AB4 era superior à de Nova Lisboa.
Colocava-se a situação de como albergar os passageiros de alguns aviões pois, Hotel, só havia um!...
A pista não tinha iluminação eléctrica e a nossa cidade ficava no Cu do Mundo…
Passaram-se momentos de indecisões e, eis que o nevoeiro deu indícios de se dissipar. Assim, continuou Luanda a servir o tráfego aéreo. Livra…

6 - No dia 22 de Maio de 1972 em que um Friendship Fokker-27, da DTA, caiu no mar, junto de Lobito, a ansiedade de saber sobre a possível existência de sobreviventes era enorme. O co-piloto Mesquita foi um dos três sobreviventes e, tinha família na cidade de Henrique de Carvalho. Nessa altura, morreram vinte e dois passageiros e, um dos meus amigos de infância, militar no exército e jogador da equipa do Moxico, campeã de Angola em 1972, escapou-se por sorte. Quis o destino determinar-lhe fazer viagem por terra quando, lhe tinham já pago a viagem para seguir nesse avião.
Estava de serviço, no controlo, e recebi uma notícia particular de Luanda em que me solicitaram para dar a informação à família do co-piloto em como ele estava vivo. Foi um alívio para os familiares e, uma grande alegria que lhes dei porquanto, servi de primeira fonte informativa. Para mal do destino, esse piloto viria a falecer, anos mais tarde, num acidente aéreo, comandando um avião ao serviço da Sata, numa das ilhas centrais dos Açores.

7 - Encontro-me na Torre, dou autorização a um T-6 para aterrar mas, nem o vigio a cem por cento. Condições normalíssimas de tempo, pista toda por conta do avião em causa - que ficasse à vontade…
Mas, eis que ao olhar para a pista, vejo uma imensa nuvem de poeira!? Nem disse nada, no momento…
Quando fui almoçar, perguntei ao piloto. Eh.. pá… Andavas ás curvas na pista? Diz-me ele - não digas nada, o mecânico, distraidamente, carregou num dos pedais quando o avião estava mesmo a tocar o asfalto…

8 - Pilotos brincalhões e experientes, conheci muitos porém, num dia de vento moderado, assisti a uma aterragem de um Dornier-27, que mais parecia um helicóptero.
Vejo a DO com boa altitude a fazer-se à pista, dou-lhe autorização para aterrar e começo a avistar-lhe todos os movimentos. Devagarinho, contra o vento, desce-me como se fosse uma pessoa a descer os degraus de uma escada.
Devagarinho, de solavanco em solavanco, cai quase na perpendicular, dá um pulo no chão e, pára. Gozei com o espectáculo - nunca tinha visto coisa semelhante!
Cabo Verdeano de origem; o saudoso Alex…cumulativamente piloto do Governo Provincial.

9 - Fim de ano de 1973, tinha na cidade, família e, uma correspondente, a qual viria a ser minha mulher. Esta, tinha vindo passar o ano a Saurimo e, precisamente, no cinema Chikapa, com festa e bailarico!...
À partida, rumo a Malanje, eis que se encontra por debaixo da Torre para subir para o avião da DTA.
Disse para comigo!... - gostava de lá ir abaixo e, despedir-me dela!...
Chamei o especialista de comunicações, que se encontrava no seu posto e, solicitei-lhe que desse as instruções ao piloto para a descolagem. Não se previa mais movimentação de tráfego e, estes nossos companheiros tinham alguma instrução porque, ajudavam o controlo nos destacamentos.
Desci, esperei uns minutos, despedi-me dela e, voltei à Torre com ansiedade e expectativa.
Entretanto, tinha avistado outro avião a fazer-se à pista e, precisamente no momento da descolagem do F-27 da DTA.
Na Torre, vi o companheiro com aspecto amarelado, que me disse: Ehhh pá… apanhei um cagaço do car…!
Então?! … Ohhh … dar as instruções ao piloto da DTA, lá dei, mas apareceu-me outro a pedir instruções para aterragem e, eu fiquei a ver navios, em vez de aviões…
Vim a saber que os pilotos se entenderam pelas comunicações que travaram e, para nossos agradecimentos, nem o militar,  nem o civil, fizeram participação do acontecimento ao nosso comando militar.
Ainda hoje vivo esta situação como uma falha de responsabilidade que poderia ter dado para o torto…

10 - Parte do Luso um PV-2 com destino a Henrique de Carvalho. Comandava-o um Tenente que dava para o gordinho, meia-idade, e um pouco falador.
No subcomando, acompanhava-o o Gomes da Silva. Registei a hora da sua partida por comunicação com os colegas do Luso e, aguardei pelo contacto da aeronave. Sabíamos qual o tempo de rota para este tipo de aeronave e, não é que já passava do tempo e, a comunicação não saía!…
Chamei, chamei e, eis que me contactam. Informam-me da sua posição e, comunicam-me a hora prevista de aterragem.
Passa o tempo e, só muito mais tarde me pedem autorização para aterrar.
Conclusão, vim a saber por especialistas que, os dois pilotos vinham numa discussão sobre qualquer assunto e, distraidamente, prosseguiram rota sem terem dado conta da emissão do rádio farol de Henrique Carvalho. E, …não é que já se encontravam na fronteira do Congo !?

11 - Trovoada, trovoada que nunca tinha visto com tamanha dimensão!... Na Torre, equipamentos quase todos desligados, encontrava-me deitado na maca a pedir aos Deuses para não levar com um raio na tola. Tirei imensas fotos com o céu varado de raios… Parecia um festival de foguetes…
Um colega, da sala de despacho, receando pela minha vida, chamava-me pela fonia. Eu, ouvia, mas evitava responder-lhe. Mas, tanto chamava que eu carreguei na tecla para emitir-lhe a mensagem. Nesse momento, levei com um coice, que me deitou ao chão. Caraças, coincidência dos raios…
Pior, pior, poderia ter acontecido a um colega Opcart chamado Carrão.
Era mais velhinho do que eu e, o tempo do Leste estava a estragá-lo no vício das bebedeiras. De serviço, passava as noites, na Nocal.
Noite de trovoada, já com os copos, resolveu descer a Torre pela parte que ligava o fio condutor do pára-raios!...Foi um doido de varrer…

12 - Trovoada, trovoada, também surgiam para os lados de Gago Coutinho….
Voz fraquinha, lá longe, com atrapalhação, ouvia eu, um piloto chamar….
H. Carvalho… H. Carvalho… daqui, Do…. A tantos graus de Latitude/longitude, com proveniência de Gago Coutinho e com destino ao Luso. Tenho dificuldades em prosseguir rota. Grande turbulência, trovoada, escuto…
O.K. mensagem recebida. Vou contactar o Luso e informar Luanda da sua posição. Sempre que possa vá transmitindo a sua posição e estado.
As mensagens surgiam cortadas, pausadas, sumidas e interrompidas. Interromperam de vez e, fiquei sem saber se o “zingarelho” tinha caído ou, não…
Chamei o Luso para indagar sobre o acontecido. Tinha o nosso grande amigo Pinheiro conseguido sobreviver a uma tempestade medonha.
Para minha alegria, contactei com ele anos atrás, era piloto militar de carreira e oficial superior.
Grandes aventuras tive com ele de avião, T-6 e DO-27.
Continua "majestosa" ao serviço da Base Aérea de Saurimo - foto do Comandante João Pinto


Enfim, era nesta Torre que escrevia as minhas cartas aos meus pais, irmã, amigos e namorada. Nesses momentos saudosos, aplicam-se com justeza os versos da Balada de Henrique de Carvalho, da autoria do nosso companheiro Rocha Marques (piloto), quando narram o seguinte:

Quando a noite veste de sombras o mundo,
E o silêncio me desperta a solidão,
Verto lágrimas e o meu sofrer é profundo,
Põe-me louco de saudade o coração…

…,     …,”


Por: Vitor Oliveira


quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

A VISITA DA RAÍNHA NHAKATOLO AO CHILOMBO

Chilombo

Chilombo, Leste de Angola – 1974 

Nhakatola Tchissengo
Nhakatolo Tchissengo, acompanhada pelo príncipe consorte Alberto Candembe, alfaiate de profissão, e por Kakengue, soba do quimbo (aldeia) do Chilombo, deslocava-se em direcção ao aquartelamento do Destacamento nº. 6 de Fuzileiros Especiais instalado no Chilombo, na margem do rio Zambeze, no designado saliente do Cazombo, Leste de Angola, com a altivez, a simplicidade e a segurança de uma rainha.
Vinha em visita oficial, no âmbito da missão habitual de governo do seu povo.

Para organizar a visita ao Destacamento e acompanhar a Rainha, foi nomeado oficial do protocolo o STEN FZE Paiva e Pona.
Era a meio da manhã, quando o calor já começava a apertar. Simpaticamente terá oferecido à Rainha um chá e uns scones. Mas ela, pequenina e viva, sorrindo com um olhinho maroto, pediu: “Ténénté não pode ser antes uma cérveja?” Claro que rapidamente apareceram cervejas para toda a comitiva. De notar que este bem precioso àquela hora de sol e calor era ainda mais valioso, no nosso caso, porque dispúnhamos de geladeira.
O certo é que as relações diplomáticas entre o povo Português (aqui representado modestamente pelos fuzileiros do Chilombo) e o povo dos Luenas, na pessoa da sua Rainha, se estreitaram naquela manhã de calor africano e se fortaleceram à custa de uma boa quantidade de cervejas que, só à sua conta, a senhora bebeu.
Descendia de uma velha linhagem de matriarcas – em África, o poder tribal assente numa liderança feminina e transmitido pela mesma via, por direito próprio e não por contingência sucessória, foi relativamente frequente e, por isso mesmo, diverso da norma vigente das sociedades ocidentais.
Nhakatolo era a rainha dos Luenas, povo também designado por Luvale, tribos residentes no Alto Zambeze, reino cujos contornos geográficos não coincidiam com as fronteiras oficiais do território de Angola, estendia-se por uma vasta região que ia desde uma zona a sul do Congo (de onde provinham os seus antepassados) até à zona da actual Zâmbia, para lá das margens do rio Zambeze.
Na sequência das disputas fronteiriças entre os colonizadores europeus, em finais do século XIX, a fronteira de Angola acabou por ser definida por arbitragem do rei de Itália em 1905, deixando os Luenas repartidos por Belgas, Ingleses e Portugueses, em três colónias (hoje Estados) diferentes. A força de união deste povo, mantido geograficamente disperso, mas culturalmente coeso, é o resultado de uma liderança no feminino, em que sobressai a figura da rainha Nhakatolo Ngambo (falecida em 1914 e cujo túmulo, no Lucusse, é hoje monumento nacional), da neta que lhe sucedeu, Nhakatola Kutemba (falecida em 1956) e sua filha Nhakatolo Tchissengo que nos visitou.

Tumulo da rainha Nhacatolo Kutemba,
no Cavungo
Nhakatola Tchissengo era uma rainha que visitava o seu povo – os Luenas – com a dedicação de uma soberana que tem o dever de acompanhar os problemas dos seus súbditos, manter a coesão no seu Reino e estabelecer parcerias com as autoridades civis ou militares que, exercendo outras formas de poder num mesmo espaço territorial, eram essenciais às boas relações, à paz e ao progresso do seu povo.
A linhagem de rainhas Nhakatolo tinha por tradição prosseguir uma política de diplomacia inteligente, num equilíbrio que era um misto de aceitação interessada das autoridades dominantes e de defesa dos interesses próprios e dos valores fundamentais das suas gentes. A ligação à terra, o lugar fundamental da mulher que é quem dá de comer aos filhos, a preservação da paz e das boas relações com os poderes dominantes como elemento de protecção filial e de garantia de continuidade, tornaram esta cultura tribal diferente do que seria uma liderança masculina mais beligerante.
Cavungo, 2014
Palácio da Raínha Nhakatolo
Talvez tenha sido esta a sua força. O respeito granjeado por estas mulheres educadas para reinar, trazer a paz e prosperidade ao seu povo ao longo dos tempos e em condições políticas inconstantes e adversas, faziam da rainha Nhakatolo que conheci, uma personalidade admirável e admirada.
Tal como aconteceu com a sua mãe Nhakatolo Kutemba e a sua bisavó Nhakatolo Ngambo. Tal como hoje acontece com a neta que lhe sucedeu – a actual rainha Lurdes Tchilombo NhaKatolo, de 38 anos de idade, criada e educada pela sua avó, que tomou posse em 2004, e que é ouvida com respeito pelas autoridades oficiais.

Eduardo Ricou consulta aos leprosos 
na presença da rainha Nhakatolo,
em 1956
Conta-se uma história que muito diz sobre a 
personalidade da Rainha Tchissengo, passada em finais dos anos 50 do século passado.
O médico português especialista em lepra Eduardo Ricou (pai da Tereza Ricou), radicado em Angola, visitou a região habitada pelos Luenas numa campanha de vacinação.
Certo dia em que se deslocou a uma aldeia onde montou uma mesa debaixo de um frondoso embondeiro, com os seus instrumentos médicos e enfermeiros de apoio, só pode começar a tarefa depois de obtida a formal autorização da Rainha.
Esta sentou-se majestosamente numa cadeira ao lado da mesa do médico, mandou içar a bandeira nacional e disse: “agora que já foi içada a bandeira portuguesa, Doutor, pode começar a consulta dos meus súbditos”.
Ou outra, em que interpelou o 
Governador Geral em visita ao distrito do Moxico e se queixou: “Governador, os teus elefantes causam muito prejuízo nas minhas colheitas, manda um caçador dar tiro neles ”. E os ditos bichos terão sido abatidos. A este mesmo Governador terá pedido um automóvel estando disposta a pagá-lo em notas, e que, posteriormente, após obtida autorização de Lisboa, lhe terá sido mesmo oferecido. 
Foi esta a “minha” rainha Nhakatolo, a que conheci em 1974, quando veio de visita a uma parte do seu povo, aquele que habitava a zona leste de Angola e que, por via disso, contactou as autoridades militares aí instaladas. Consta que tinha visitado Portugal, durante a presidência de Craveiro Lopes, numa acção de sensibilização organizada pelo regime, com quem, interesseiramente ou não, pretendia mostrar boas relações. 
Naquela época residia para lá da fronteira de Angola, território da Rodésia (actual Zâmbia) e deslocava-se entre as aldeias onde os Luenas se encontravam.
Raínha Nhakatolo Tchissengo e príncipe Alberto Candembe na sua casa no Cavungo, em 1970 - foto de Álvaro Pelicano

Tinha autorização especial para visitar os seus súbditos em território angolano ao abrigo de um tratado de protectorado celebrado com a Coroa Portuguesa em finais do séc. XIX e que sempre foi respeitado. 
Foi uma das rainhas Nhakatolo que mais marcas deixou, talvez por ter tido uma vida longa e por ter passado por períodos conturbados da história de Angola. 
Chefiou tribos e acompanhou várias aldeias luenas durante toda a sua juventude, exercendo uma aristocracia natural enquanto a mãe reinava – foi nomeada para assumir o sobado de duas localidades autónomas: Lupache e Luvua antes da morte da sua mãe, em 1956. Sucedeu-lhe formalmente, atravessou duas guerras – a guerra do ultramar e a guerra civil – e veio a falecer em Luanda em 22 de Junho de 1992, estando sepultada em Cazombo, na província do Moxico. Em sua homenagem foi inaugurado, em 2012, um lar para a terceira idade que recebeu o nome “Rainha Nhakatolo Tchissengo”.
Raínha Nhakatolo Tchissengo e 
príncipe Alberto Candembe com
Álvaro Pelicano,
no Cavungo em 1970
A minha estória da rainha Nhakatolo é um simples contributo para retratar uma rainha tradicional que era uma mulher poderosa, ciente das responsabilidades de governante da sua gente, que tinha a particularidade de ser um povo que não corresponde ao conceito linear de “Uma Pátria, uma Nação, um Território”.
O território civil do quadrado do Leste de Angola, desenhado a régua e esquadro, não era a pátria dos Luenas, mas apenas um local onde uma parte deles se instalara, em resultado de um processo migratório de tribos de várias etnias, de acordos e protectorados estabelecidos ao longo de séculos com os países colonizadores e com outras tribos e etnias autóctones.
A visita à povoação e a recepção à Rainha foi uma festa especial a que o nosso Comandante, 1º.TEN EMQ (FZE) Correia Graça e restantes oficiais assistiram, mais uma vez, num concílio que debaixo de uma grande árvore reuniu os mais velhos, os mais importantes representantes dos luenas e as autoridades existentes na zona. 
De pé, frente à assistência, a rainha discursou em português para o seu povo, dando bons conselhos, talvez cautelas para com o colonizador… mas acreditamos que fossem no espírito de manter o bom relacionamento, usufruindo dos bens possíveis (saúde e educação que, sendo escassas, sempre havia).
Desse discurso retivemos três notas: “Os caçadores, quando encontrarem pessoas estranhas, nas suas caçadas, devem informar os fuzileiros. Os pescadores, quando também avistarem pessoas estranhas à povoação, devem informar os fuzileiros. E vós p... lembrem-se que os fuzileiros não têm aqui mãe, nem mulher, nem namorada e, por isso, devem tratá-los bem...”.
Depois, houve batuque pela noite fora…
Este ritual tradicional, festa que une os Luvale (Luenas) e é um marco da preservação da sua cultura, realiza-se actualmente no dia do falecimento da rainha Chissengo.
Na era colonial, realizava-se em Chilombo ou em Lumbala, no período da guerra civil passou para a Zâmbia devido às disputas entre o MPLA e a UNITA e, actualmente, regressou ao leste de Angola, saliente do Cazombo, capital Luena.
Numa cerimónia pública em 2009





Por:
José António Ruivo, in O Desembarque

quinta-feira, 17 de novembro de 2022

NORTH AMERICAN T-6 TEXAN










North American T-6 Texan (também designado Harvard, Yale, T-Bird, Mosquito, ou simplesmente T-6 ou SNJ) foi um avião de instrução criado durante o final da década de 1930, posteriormente construído em grande número e utilizado por mais de 55 forças aéreas de países de todo o mundo até meados da década de 1970. Foram construídas 15.495 unidades de T-6 em diversas versões pela North American Aviation e por empresas não Americanas sob licença nomeadamente a canadiana Canadian Car & Foundry (outras fontes indicam números de produção de 17.096 unidades, 20.110, ou 21.342 considerando neste caso todas as variantes derivadas do NA-16). Embora construído para instrução básica o T-6 acabaria por desempenhar funções de combate, nomeadamente missões contrainsurgência (COIN) em alguns conflitos regionais na segunda metade do Seculo XX, depois de participar ativamente nos três últimos grandes conflitos do Século, Segunda Guerra Mundial, Guerra da Coreia e Guerra do Vietename. Apesar disto o T-6 Texan é conhecido fundamentalmente per ter sido um excelente avião de instrução responsável pela formação de centenas de milhares de pilotos ao longo de cinco décadas.

HISTÓRIA
Origem
A origem do T-6 remonta aos primeiros anos da década de 1930, quando a General Aviation Corporation, projectou, um pequeno mono-motor de asa baixa com dois postos de pilotagem em tandem, sem cobertura e trem de aterragem fixo, destinado à instrução de pilotos, que designou por GA-16 (algumas fontes referem que GA-16 terá sido a primeira designação do projeto, outras no entanto referem a ausência de documentação que suporte essa ideia afirmando que toda a documentação, se refere ao projeto como NA-16)
NA-16 na sua configuração original,abril,
1935
A General Aviation Corporation era uma empresa com antecedentes na Atlantic Aircraft Corporation criada nos anos de 1920 por Anthony Fokker, mais tarde Fokker Aircraft Company of America que se tornaria subsidiária da General Motors Corporation que em 1929 adquiriu 40% da companhia. Em 1931 Fokker terminou a sua associação com a GMC e esta tornou a companhia como sua subsidiária para a aviação tornando-a em 1931 na General Aviation Corporation, que em 1934 daria lugar à North American Aviation, Inc.
Fontes referem que o NA-16 terá sido projetado por iniciativa própria da North American (ainda General Aviation Corporation) antecipando as necessidades do mercado norte-americano e de exportação, outras, no entanto, referem que terá sido projetado, especificamente responder ao concurso de 1934 da USAAF para uma aeronave de instrução básica.
Certo é que o projeto foi liderado por James H. “Dutch” Kindelberger e por Jonh Leland “Lee” Atwood, ambos recrutados da Douglas Aircraft Company onde tinham estado envolvidos no projeto do DC-1, e que de Dezembro de 1934 a Abril de 1935 o NA-16 passou de um esboço de projeto a um protótipo para teste de voo.
NA-16, na sua configuração definitiva
apresentado 
em junho de 1935
no aerodromo Wright
O NA-16 tornou-se o primeiro da família de monomotores, monoplanos de asa baixa, com dois lugares em tandem, que viriam a ser conhecidos por T-6 Texan, embora adquirissem muitas outras designações, consoante a variante, o local de produção ou o país onde operavam.
As variantes iniciais podiam ter os cockpits abertos (o protótipo e a NA-22), ou sob uma única canópia tipo estufa que podia ou não possuir uma posição para uma arma traseira, operada pelo segundo tripulante. A fuselagem era, inicialmente construída a partir de tubos de aço com revestimento de coberta de tecido, mas posteriormente passou a ser construída numa estrutura monocoque de alumínio. As primeiras versões possuíam um trem de aterragem fixo mas rapidamente foi implementado um trem retrátil montada numa seção alargada do centro da asa (que poderia ou não ter tanques de combustível integrados).

Variantes iniciais
NA-18, depois da apresentação o NA-16 foi
modificado 
com uma maior canopia com
provisao  para uma arma e 
provisao
para duas armas no capo do motor
O NA-16 fez seu primeiro voo em abril de 1935, em Dundalk, com registro civil X-2080 e após testes de voo posteriores a USAAC considerou-o a melhor aeronave apresentada no aeródromo Wright não apenas como aeronave de instrução mas com hipóteses de, com algumas modificações, se tornar numa aeronave de combate. Modificado, o protótipo tornou-se no NA-18, com os cockpits em tandem cobertos com uma canópia tipo estufa com aberturas deslizantes individuais, trem de aterragem fixo, e um motor radial Pratt & Whitney R-1340 Wasp de 660cv
Esta aeronave foi posteriormente vendida á Argentina, mas no final de 1935, a USAAC adotou-a como aeronave de instrução contratando à North American 42 unidades sob a designação de BT-9 equipadas com motor Wright R-975 Whirlwind . Com a segurança que esta encomenda deu, a empresa mudou-se para a Inglewood, Califórnia, a partir de onde daria resposta às encomendas seguintes produzindo diversas variantes em resposta aos pedidos da USAAC, US Navy e de países estrangeiros incluindo Reino Unido, França (após a capitulação de França as aeronaves encomendadas, a maioria delas com o escape alongado acima da raiz da asa de estibordo seriam desviadas para o Canadá, onde passariam a ser designadas por Yale), Canada, Suécia (produzido localmente como SK-14, com motores italianos Piaggio), Austrália e mesmo Japão (a variante da marinha japonesa, produzida localmente, era designada por Kyushu K10W, incorporava várias modificações locais, principalmente na cabine, seção traseira da fuselagem e empenagem vertical, e era equipada com motor Kotobuki que movia uma hélice de madeira).
BT-9A em Langley
Á USAAC foram posteriormente fornecidas 40 unidades da versão BT-9A armada com duas metralhadoras de 7.62 mm na capota do motor (estas aeronaves foram mais tarde redesignadas por BC-1B), 117 unidades BT-9B (NA-23), uma versão melhorada da versão inicial desarmada, 97 BT-9C (NA-41) equipados com melhores equipamentos.
A US Navy encomendaria 40 unidades adaptadas para instrução sob a designação de NJ-1 (NA-28) e posteriormente mais 61 unidades NJ-2 com um motor diferente.
Na realidade, enquanto que a US Navy pretendia um avião de instrução simples, com trem de aterragem fixo, o USAAC tinha em vista um avião de trem de aterragem retráctil, que combinasse o treino básico com atividades operacionais, devendo estar dotado de equipamentos de radiocomunicações, instrumentos de navegação e prever a hipótese de instalação de armamento.
O novo desenvolvimento originaria entretanto o NA-26 que ganharia o concurso para o fornecimento de 180 aeronaves à USAAC (United States Army Air Corps ) em 1937, como BC-1 (Basic Combat Training).
SNJ-1
Estas aeronaves incorporavam alterações no perfil das asas, com tanques integrados, modificações da fuselagem e revestimento, um novo motor de maiores dimensões Pratt & Whitney R-1340-47 Wasp que operava uma hélice de Hamilton de passo variável, e um sistema hidráulico, introduzido para operar as superfícies móveis de controlo e o novo trem de aterragem retrátil (uma exigência da USAAC face aos trens fixos dos BT-9).
A USAAC recebeu 177 unidades BC-1 das quais cerca de 30 unidades seriam posteriormente modificadas para instrução de voo por instrumentos sendo designadas por BC-1I.
A introdução de uma nova fuselagem semi-monocoque totalmente metálica desenvolvida para o design NA-58, originou a versão BC-1B, da qual seriam produzidas 93 unidades para a USAAC.
Em 1940, a US Navy, reconhecendo o interesse do trem de aterragem retráctil, encomendou 270 aviões de um novo modelo básico, para equipar 13 Esquadras da Reserva Aérea Naval (NAR). Os aviões, semelhantes aos BC-1, foram designados por SNJ-1 e SNJ-2. Os semelhantes aos BC-1A foram designados por SNJ-3.
BT-14 (NA-58) em voo
O BT-9 evoluiria para a versão BT-14 (NA-58), que apresentava melhorias aerodinâmicas, incluindo uma canópia redesenhada, uma fuselagem metálica semi-monocoque mais longa, em substituição fuselagem tubular coberta de tecido das versões anteriores, e motor Pratt & Whitney R-985 Wasp Junior. A empenagem foi também modificada acompanhando o alongamento da fuselagem de forma a manter o centro de gravidade da aeronave devido ao avanço da posição do motor, e o leme adotou uma forma mais triangular em substituição da forma arredondada das versões anteriores. 

Variantes e produção do T-6 Texan
O NA-77 (AT-6A), com motor Pratt & Whitney R-1340-49 Wasp, incorporava a fuselagem e empenagem do NA-58, as asas, sistema hidráulico e trem de aterragem retrátil do NA-26 entre outras melhorias e pequenas mudanças na posição do segundo tripulante proporcionaria a base para a família AT-6 cuja designação surge em 1940, quando a USAAC substitui a designação BC para AT (Advanced Training) e a aeronave da North American passou a designar-se por AT-6 (nesta fase a aeronave proporcionava já capacidade para instrução de pilotos de combate e artilheiros proporcionada pela possibilidade opcional de montar metralhadoras fixas e móveis, bem como a possibilidade de transportar bombas de pequenas dimensões sob as asas).
AT-6C, FA Colombiana
Entretanto a North American Aviation, incapaz de responder às encomendas, mesmo após a expansão da fábrica da Inglewood, construiu em Dallas, no Texas uma nova instalação para onde foi transferida toda a produção dos AT-6, conduzindo que a partir de 1942 a aeronave passa-se a ser conhecida por Texan, independentemente do fato de que, desde 1938, os aparelhos destinados à Commonwealth britânica serem designados como Harvard.
A USAAF recebeu 1.549 aeronaves AT-6A e a US Navy, 270 sob a designação SNJ-3, das quais, 517 foram ainda construídas nas instalações da North American na Califórnia, antes da produção ser integralmente transferida para o Texas.
O modelo AT-6B, com motor Pratt & Whitney R-1340 AN-1 Wasp de 600cv, destinado à instrução de tiro, dispunha de duas metralhadoras nas asas e uma, móvel, no lugar de trás tendo sido produzido para a USAAF e US Navy.
Durante o período da Guerra foram também produzidos 2970 aeronaves AT-6C e 2.400 como SNJ-4 baseados no design NA-88, construídos com materiais não estratégicos, com o contraplacado e tela a substituírem o alumínio. A RAF recebeu 726 unidades da AT-6C como Harvard IIA .
SNJ-3, USAAF, Gulfo do Mexico, 1943
As modificações no sistema elétrico, que passou dos 12 volts para 24, originaram a versão AT-6D, da qual foram produzidos 3713 aviões para a USAAF e 1357 para a US Marinha como SNJ-5 . Equipado com instrumentação Britânica e sem armamento o AT-6D foi designado como Harvard III, do qual foram fornecidas 351 unidades à RAF e 564 à FAA (Fleet Air Arm da Royal Navy).
As ultimas aeronaves Texan construídas pela North-American Aviation foram 956 unidades da versão AT-6F (NA-121) construídas para a USAAF, parte das quais 411 seriam transferidas para a US Navy como SNJ-6. Esta versão incluía uma fuselagem reforçada e diversas outras pequenas modificações.
Em 1947 é criada a USAF, em substituição da USAAF que logo se confrontou com a falta dos meios necessários para proporcionar aos pilotos uma instrução atualizada e de nível mais elevado. Fez então o levantamento dos custos entre a recuperação e atualização dos aviões existentes e o estudo e construção de um avião inteiramente novo, resultado desse estudo a opção pela atualização dos AT-6 existentes. A partir de 1948 todos os AT-6 Texan no ativo da USAF passam a ser designados por T-6 Texan e em Junho de 1948 começam a entrar ao serviço os T-6G Texan (NA-168). Estas aeronaves são o resultado das modificações introduzidas nos modelos construídos durante a guerra, incluindo a introdução de um painel de instrumentos atualizado, uma cabina com melhor visibilidade, depósitos de combustível com maior capacidade, hélices diferentes, com um cubo de hélice (spinner) para proteger o comando do controlo de velocidade da hélice, mastro da antena de pequena dimensão colocado na secção posterior da fuselagem, instrumentos de navegação atualizados e roda de cauda com controlo do mesmo tipo do F-51 Mustang. Os trabalhos de modernização dos AT-6 decorreram em Downey, Califórnia, de onde saíram com novos números de série, entre 1949 e 1953.
Também os Texan da US Navy foram modernizados para o padrão T-6G passando as aeronaves a ser designadas por SNJ-7.
Harvard Mk IV (T-6J), Museu do Ar
Durante a Segunda Guerra Mundial a empresa canadiana Noorduyn Aircraft Limited construíra 1500 AT-6A com motor Pratt & Whitney R-1340-NA-1 Wasp, para a USAAF e 2485 para a RAF como Harvard Mk IIB algumas das quais seriam utilizadas pela FAA da Royal Navy. Em 1946 a Noorduyn Aircraft Limited é adquirida pela Canadian Car & Foundry que adquire os direitos de produção do T-6 Texan à North American Aviation após o encerramento da produção da aeronave no Texas. 
Até 1951 a Canadian Car & Foundry iria produzir em Fort William 555 unidades do Harvard Mk IV equivalente ao T-6J Texan da USAF, 270 destinados à RCAF (Royal Canadian Air Force) , e 285 para a USAF, parte destes destinados à Força Aérea da Republica Federal Alemã. 

Atividade operacional e uso em combate
O North American AT-6 foi projetado e construído como uma aeronave de instrução primariamente para a USAAC e US Navy. Quando os EUA entraram na Segunda Guerra Mundial existiam já cerca de 2000 unidades destas aeronaves nas suas diversas versões a operarem na instrução de pilotos para a USAAC e US Navy, mas tinham também sido exportadas em grande número para o Reino Unido (a RAF recebeu o primeiro Harvard Mk I, semelhante ao BC-1 da USAAC, mas com equipamentos de origem britânica em Dezembro de 1938, de um total de 200 exemplares encomendados,) e outros países da Commonwealth (aí tinham a designação de Harvard) onde foram usados no treino de pilotos e artilheiros da RAF, FAA da Royal Navy e de outras forças aéreas de países da British Commonwealth, nomeadamente Canadá, Nova Zelândia, Índia e Austrália. Na Austrália, a Commonwealth Aircraft Corporation, foram produzidas 755 aeronaves derivadas do Harvard, designadas por CAC Wirraway que evoluiriam para o caça CAC Boomerang, ambas utilizadas durante a Guerra como caças-bombardeiros em operações contra os japoneses na Malásia, Bornéu e Nova Guiné.
LT-6G do 6147º TCG, sobre a Coreia, 1952
Finda a Guerra, a USAF e a US Navy adotaram o T-6 Texan como aeronave de instrução, após modernização das células operacionais para a versão T-6G e SNJ-7 respetivamente, mantendo-os em serviço até cerca 1962. Durante este período, 97 T-6G Texan foram equipados para operações de observação e vigilância armada, sendo operados pelo 6147ª Tactical Control Group da USAF, na Coreia durante o ano de 1953 (estas aeronaves foram designadas por LT-6G). Nestas missões que ficaram conhecidas por “Operações Mosquito”, os Texan transportavam observadores do exército, em voos de reconhecimento a muito baixa altitude sobre as linhas inimiga, atacavam as forças inimigas com bombas e metralhadoras instaladas em suportes sob as asas e dirigiam o fogo dos aviões de ataque ao solo, como controladores aéreos avançados
.
Durante a Segunda Guerra mundial a produção de T-6 Texan foi muito elevada devido à necessidade de aeronaves para a instrução de pilotos, consequentemente, quando a Guerra terminou verificou-se um elevado excedente de aeronaves dos ativos das forças aliadas. Consequentemente os T-6 excedentários da USAF e das forças da Commonwealth distribuídos (por vezes ao abrigo de programas de assistência militar do pós-guerra) por inúmeros países da NATO, França, Republica Federal Alemã, Itália, Turquia, Suécia, Holanda, Portugal e Espanha, mas também da América Latina onde quase todos os países acabariam por operar o T-6.
A qualidade comprovada destes aviões de instrução justifica a enorme procura que tiveram no mercado de segunda mão a partir da década de 1950 que se prolongou até à de 1970 alargando significativamente o número de operadores desta aeronave pelo mundo.
Em meados da década de 1980, a Força Aérea da República da África do Sul (SAAF) ainda mantinha cerca de 50 Harvard na instrução de pilotos, depois de, em 1961, ter transferido alguns para a Força Aérea Portuguesa (FAP).
Os T-6 Texan ou Harvard, embora concebidos para instrução e treino de pilotos, também foram utilizados em missões armadas no pós Segunda Guerra Mundial, pela primeira vez pela USAF na Guerra da Coreia.
Durante a década de 1950 a RAF usou os seus Harvard no Quênia durante a Revolta dos Mau Mau, armados com metralhadoras e bombas de 10 quilos (20 lb), em operações que por vezes envolviam voos acima dos 6000 metros. Em 1990 a RAF utilizava ainda alguns Harvard em vos de instrução de helicópteros uma vez que os seus Short Tucano eram inadequados para esses efeito devido a sua elevada velocidade de perda de sustentação.
T-6G da FA Portuguesa
Os franceses utilizaram os T-6G em grande numero (cerca de 700 aeronaves) no Norte de África, na segunda metade dos anos cinquenta durante a guerra da independência da Argélia. Após a independência argelina em 1962, os T-6G remanescentes foram utilizados em instrução de pilotos pela Força Aérea Francesa até 1966, depois de cerca de meia centena, preparados para operações militares, terem sido vendidos a Portugal.
Em Julho de 1960, a Bélgica utilizou os Texan e os Harvard da Escola de Aviação de Kamina, no Congo Belga, em ações militares contra os independentistas da República do Congo. Posteriormente alguns destes aviões acabaram por ser utilizados pela Força Aérea do Katanga.
Entre 1957 e 1958, também a força aérea espanhola usou o T-6 em operações de contrainsurgência durante a Guerra Esquecida (Guerra de Ifni) que opôs as forças espanholas e francesas contra o exercito de libertação de Marrocos pela posse do Saara Ocidental.
A Força Aérea do Paquistão usou o T-6G na Guerra Indo-Paquistanesa de 1971 como uma aeronave de ataque e apoio ao solo, elegendo como alvos principais as colunas de veículos ligeiros de transporte do exercito indiano.
A Força Aérea Portuguesa foi, provavelmente, o último utilizador do T-6 em operações militares. Entre 1961 e 1975, Portugal, usou algumas centenas de T - 6G em operações aéreas de contrainsurgência (COIN) durante a Guerra Colonial Portuguesa. Durante esta guerra, quase todas as bases da força aérea portuguesa e aeródromos militares nos territórios de Angola, Moçambique e Guiné tinham um destacamento de T-6G, que operavam armados com metralhadoras, bombas e casulos de foguetes.
Harvard Mk IV convertido num Zero
para o filme Tora Tora
Outros dos usos do T-6 Texan, pós segunda guerra mundial, foi a sua participação em filmes evocativos daquele conflito, como A Yank in RAF (1941), Tora! Tora! Tora! (1970) e The Final Countdown (1980), onde representou os Mitsubishi Zero japoneses, em A Bridge too Far (1977) representou o Republic P-47 Thunderbolt, e em Soldaat van Oranje (1977), um filme holandês foi modificado para representar o caça Fokker D.XXI.
Em 1985, quando o projeto do North-American NA-16 celebrava os 50 anos, ainda existia um pequeno número de Texan e Harvard em serviço militar, exemplo disso é a Força Aérea Sul Africana que os manteve em operação até 1995 como aeronave de instrução básica, grandemente devido ao embargo das Nações Unidas contra o regime do apartheid (na segunda metade da década de 1990 foram substituídos por Pilatus PC-7 Mk II.
Hoje,as muitas unidades existentes em condição de voo, nas mãos de particulares ou de museus, são aparição frequente em espetáculos aéreos, existindo nos Estados Unidos da América uma corrida aérea exclusiva deste tipo de aeronaves, um facto que constitui um testemunho da robustez e versatilidade destes aviões, por certo, um dos mais célebres aviões de instrução da história da aviação militar.

PORTUGAL
Os primeiros 28 aviões North-American T-6 Texan recebidos entre 1947 e 1950, eram das versões AT-6A, AT-6B e AT-6C, sendo destinados à Aeronáutica Militar (AM). Em 1947 foram recebidos dez AT-6A, que foram colocados na Base Aérea N° 1 (BA1) em Sintra, destinados à instrução complementar de pilotagem, para substituição dos Miles Master. Em 1948 chegaram nove AT-6A e um AT-6B dos quais três foram colocados na Esquadrilha ZE da Base Aérea N° 2, Ota, e os restantes na BA1. Em 1949 recebeu mais quatro AT-6A, e em 1950 recebeu mais dois AT-6A e dois AT-6C, todos colocados na BA1.
T-6G da FA Portuguesa armado com
metralhadoras
Quase todos estes aviões foram pintados de acordo com o padrão então em uso para os aviões de instrução, com a fuselagem em azul-escuro, e as asas e o conjunto estabilizador da cauda em amarelo. A Cruz de Cristo, sobre círculo branco, estava colocada em ambas as faces das asas. A bandeira nacional, com escudo, nos lados do estabilizador vertical e onúmero de matrícula nos lados da fuselagem, a branco.
Entre 1949 e 1950, conforme iam sendo submetidos às grandes revisões de manutenção nas Oficinas Gerais de material Aeronáutico (OGMA), em Alverca, a pintura era alterada, passando a ser inteiramente em alumínio, com a parte superior da fuselagem à frente da cabina em preto antirreflexo. Mantiveram as insígnias em ambos os lados das asas, as cores nacionais, sem escudo, no estabilizador vertical, assim como as matrículas nos lados da fuselagem, mas agora em algarismos pretos.
Em 1951 a AM adotou o sistema de numeração de quatro dígitos, recebendo os AT-6 a nova numeração, de 1601 a 1626, (dois anteriormente destruídos em acidentes já tinham sido abatidos). O número de matrícula foi colocado, a preto, em ambos os lados das asas, alternando com a insígnia e também no estabilizador vertical, sobre os retângulos com as cores nacionais. Passaram igualmente a ostentar grandes faixas amarelas a meio das asas e na fuselagem, entre a cabina e o conjunto estabilizador da cauda.
T-6G "Transformado", da FAP com o padrao
de pintura original 
de 1952  
após transformação nas OGMA
 
Entre Outubro e Novembro de 1951, ao abrigo do MDAP (Mutual Defense and Assistance Pact), a AM recebeu dos EUA, por via marítima, mais vinte aviões Texan da versão T-6G, que foram matriculados com os números 1627 a 1646.
Os números 1627 a 1633 foram inicialmente destinados à BA2 e os restantes foram entregues à BA1. Estavam especialmente equipados para a instrução de voo por instrumentos, com rádio-bússula (ADF), equipamento de rádio-comunicações de VHF, instrumentos de bordo melhorados e capota para simulação de voo sem visibilidade no lugar de trás, onde se instalava o instruendo. A roda de cauda era parcialmente comandada pelos pedais e bloqueada por ação da alavanca de comandos. A última secção da cobertura da cabina, móvel nos modelos anteriores, apresentou-se fixa, para alojar a capota do voo sem visibilidade.
Chegaram inteiramente pintados em amarelo, com o painel em frente da cabina em preto antirreflexo e foram-lhes aplicadas as insígnias e as matrículas nacionais de acordo com as normas em vigor. Para além desta pintura amarela, distinguiam-se dos anteriores pela inexistência do mastro da antena do equipamento de comunicações de HF, colocado lateralmente e à frente da cabina e pela existência da cobertura da antena loop do rádio-bússula, atrás da cabina.
T-6G da FA Portuguesa equipado
com foguetes a antena do

ADF é visivel logo atrás da canópia
Estas aeronaves eram conhecidas pelo pessoal da AM por Harvard, embora todas as aeronaves existentes fossem de facto North-American AT-6A, AT-6B e AT-6C e T-6G Texan. Talvez tenha sido influência o facto da maioria dos aviões de que a AM então dispunha ser de origem britânica e estes designarem os T-6 por Harvard cujas primeiras unidades apenas chegaram em 1956.
A Aviação Naval (AN) recebeu em 1950 oito aviões North-American SNJ-4, a versão dos North-American AT-6D utilizada pela US Navy, tendo-lhes sido atribuídas as matriculas de I-1 a I-8, e sendo colocados no Centro de Aviação Naval (CAN) , de S. Jacinto em Aveiro, para instrução de pilotagem sendo mais tarde transferidos para a Base Naval do Montijo.
Estavam pintados inteiramente em alumínio, com a parte da fuselagem em frente da cabina em preto anti-reflexo, a Cruz de Cristo, sem círculo branco, no extradorso da asa esquerda e no intradorso da direita, e as cores nacionais, sem escudo, a cobrir completamente o leme de direcção. A matrícula, em preto, estava colocada em ambos os lados da fuselagem, abaixo do para-brisas.
T-6G da FA Portuguesa com foguetes
e
 antena tipo gotado RDF
(
Radio direction finderatrás da canópia
A Força Aérea Portuguesa (FAP), criada em 1951, e no ano seguinte recebeu os Noth-American AT-6, os T-6G Texan da AM e os SJN-4 da AN. Os primeiros, dado que já usavam as matrículas segundo o esquema adotado pela FAP, mantiveram a numeração de 1601 a 1646 e os oriundos da AN receberam as matrículas de 1647 a 1654 (na realidade, continuaram a ser referidos e a ostentar a numeração da AN até serem submetidos às grandes inspeções realizadas nas OGMA). A quase totalidade destes aviões foi reunida na BA1, que, nessa altura, começou a desenvolver grande atividade, com cursos simultâneos, utilizando-os na instrução de pilotos. Apenas algumas unidades ficaram colocados na BA2, Ota, e na BA6, Montijo.
Em 1952, a FAP decidiu uniformizar as diversas versões que possuía do T-6 Texan, convertendo todas as aeronaves no ativo para a versão North-American T-6G Texan, uma tarefa levada a cabo pelas OGMA, que uniformizou também a pintura. Os T-6 passaram a apresentar-se pintados em alumínio, com a secção em frente à cabina em preto anti-reflexo e com grandes faixas amarelas a meio das asas e da fuselagem, com a insígnia e a matrícula segundo o padrão adoptado pela FAP. Passaram a presentar no lado esquerdo da fuselagem, sob o pára-brisas, uma estreita faixa vertical que referenciava os aviões transformados e os T-6G originais, que ficaram conhecidos por “transformados” e “puros”, respetivamente. Assim, a faixa amarela com a secção central a vermelho indicava os “transformados” e a faixa inteiramente a amarelo, os “puros”. Foi a partir desta uniformização que os North-American AT-6 deixaram de usar os cubos dos hélices e as portas do trem de aterragem.
Harvard Mk IV, (T-6G)  FAP, a ser equipado
 com casulos de metralhadoras nas asas,
Cufar, Guiné (década de 1960)
Em Março de 1956 foram recebidos mais 15 aviões, construídos no Canadá, provenientes da Fleet Air Arm da Royal Navy. Eram da versão Harvard Mk III, muito semelhantes aos T-6G Texan, tinham a particularidade de usar um tubo de escape mais comprido, que se estendia ao longo da fuselagem, até meio da asa. Chegaram pintados de amarelo e mantiveram a pintura de origem por algum tempo, até serem convertidos nas OGMA em T-6G Texan e pintados como os restantes aviões deste tipo. Foram identificados com as matriculas de 1655 a 1669 e colocados na Esquadra de Instrução Básica de Pilotagem (EIBP) da BA1, Sintra.
Em 1961, com o início da Guerra do Ultramar, os T-6 começaram a ser enviados para as províncias ultramarinas portuguesas, não antes de passarem pelas OGMA, onde foram preparados para usar armamento suspenso nas asas, recebendo suportes para bombas, metralhadoras e casulos de foguetes. Foram retiradas as faixas amarelas das asas e da fuselagem, mantendo-se a pintura inteiramente em alumínio.
T-6G da FAP
Em 1961 a França forneceu a Portugal 46 aviões North American T-6G, e em 1962 mais 10, que havia utilizado em operações de contrainsurgência na Argélia, já preparados para transportar armamento sob as asas, bombas, casulos de foguetes de 68 ou 37 mm, ou ainda, metralhadoras MAC-Match de 7,62 mm. Depois de inspecionados nas OGMA e matriculados com os números 1670 a 1725, foram praticamente todos enviados para o Ultramar, onde operaram a partir de Março de 1961. Porém a utilização em combate das metralhadoras francesas revelou-se dececionante pois encravavam sistematicamente, o que fez acionar a conhecida «arte e engenho» dos portugueses, que as substituíriam pelas Browning de calibre 7,7 mm, recuperadas dos Spitfire e Hurricane abatidos em 1953.
Em 1963, a EIBP foi transferida da BA1 para a então BA7, S. Jacinto, e com ela os T-6 da instrução. Simultaneamente com esta transferência a EIBP passou a ser designada por Esquadra 71.
A maior remessa de T-6 recebida em Portugal ocorreu em 1964, com a receção de 65 aviões da versão Harvard Mk IV construídos pela Canadian Car & Foundry (CCF), cedidos pela República Federal da Alemanha que tinham sido utilizados pela Luftwaffe desde 1956. Tal como os anteriores, foram matriculados, com os numeros 1726 a 1790, inspeccionados nas OGMA, onde receberam as insígnias e marcas de identificação da FAP e a maior parte, seguiu para o Ultramar (Destes aviões, o número 1788 foi, provavelmente, o último T-6 produzido pela Canadian Car & Foundry).
T-6G, FA Portuguesa, em voo de baixa
altitude em África
Em 1965 foram adquiridos no mercado civil, cinco T-6 de várias versões (2 Harvard Mk IIb, 2 North-American AT-6F e 1 North-American AT-6A), que foram matriculados com os numeros 1791 a 1795, depois de receberem o mesmo tratamento dos anteriores.
No ano de 1966, um reduzido número reduzido de T-6 foram transferidos para a BA3 em Tancos, onde passou a ser ministrado o treino operacional, e colocados na Esquadra 31, denominada de “Tigres”. Foi-lhes pintado, a meio da fuselagem o tradicional emblema de Tancos, o galgo, não na habitual cor amarela, mas a preto.
A última aquisição de T-6 ocorreu em 1969, à República da África do Sul que forneceu 60 aviões, 42 Harvard Mk IIa (equivalentes aos North-American AT-6C) e 18 Harvard Mk III (equivalentes aos AT-6D). Cinquenta e um voaram da África do Sul para o Cuito-Cuanavale em Angola, tripulados por pilotos sul-africanos e nove foram transportados por via marítima para Lourenço Marques em Moçambique. Esgotado o bloco de matrículas da série 1600 e com o bloco 1700 ocupado até 1795 inclusive, a FAP atribuiu-lhes matrículas do bloco 1500, de 1501 a 1560. As quatro vagas do bloco 1700 nunca foram preenchidas. Embora todos tenham recebido matrícula e estivesse planeada a sua transformação para o padrão T-6G usado pela FAP, trabalho a efetuar nas OGMA, nem todos foram transformados, nem sequer se tornaram operacionais. Alguns nem chegaram a ser transportados de África para as OGMA.
T-6G, da FAP, armamento e pontos de
suspensão das asas
Os T-6 adquiridos, e enviados para Africa, destinaram-se a ser usados em operações de contrainsurreição (COIN) durante o período que durou a guerra colonial (1961 a 1974) nas províncias ultramarinas africanas.
Na Guiné Bissau operavam 26 aeronaves T-6 Texan, a partir da BA12 em Bissalanca, em Angola, 40, a partir dos aeródromos-base em Negage (AB3) e em Henrique de Carvalho (AB4), e Moçambique dispôs de 36 T-6 a operar a partir de Nova Freixo (AB6), Tete (AB7), e Lourenço Marques (AB8). A acção dos North-American T-6 nas frentes de combate da Guiné, Angola e Moçambique foi muito importante no esforço de guerra e, mesmo depois da entrada em ação dos F-84G Thunderjet e Fiat G-91 R/4, continuaram presentes em todas as operações, fornecendo apoio de fogo ou servindo de posto de comando aéreo.

Os T-6G da FAP nas operações em Africa podiam ser equipados com os seguintes armamentos:
  • 2 casulos de 2 metralhadoras MAC AA-52 de 7.62 mm com 300 munições cada, mais tarde substituídas por Browning 7.7 mm; ou
  • 2 casulos Matra 361 de 36 foguetes SNEB T/447 37 mm; ou
  • 2 casulos Matra 181 de 18 foguetes SNEB T/447 37 mm; ou
  • 2 bombas GP (general purpose) M1-62 de 50 Kg; ou
  • 2 bombas Napalm de 100 l/80 Kg, ou
  • 6 bombas de fumo (p/treino) de 25 Lbs; ou
  • 6 bombas antipessoal M/62 de 15 Kg; ou
  • 2 lançadores de 24 Granadas de mão
Registaram-se perdas em quantidade significativa, uns abatidos por fogo inimigo, e outros em acidentes, motivando a morte de muitos pilotos. Ainda que de uma forma não exaustiva, entre 1961 e 1975 foram identificados 51 aviões T-6 abatidos ou acidentados que provocaram a morte de 43 tripulantes, quase todos pilotos. 
AT-6C, FAP, pertencente ao Museu do Ar
A partir de 1973 a FAP adotou o esquema de pintura antirradiação, para as aeronaves localizadas nas províncias ultramarinas, devido à utilização de mísseis terra-ar pelos guerrilheiros, mas este esquema de pintura foi aplicado a um reduzido número de T-6. Com este esquema a aeronave era inteiramente pintada em verde-azeitona, mantendo a pintura preta antirreflexo em frente da cabina. O esquema das insígnias e marcas de identificação foi ligeiramente alterado, com a insígnia da Cruz de Cristo, sobre círculo branco, com menor diâmetro e colocada somente nos lados da fuselagem, mantendo-se as cores nacionais no estabilizador, com a matrícula por cima. 
Terminada a Guerra do Ultramar, um número relativamente reduzido de T-6 regressou a Portugal, sendo colocados na Base de S. Jacinto, onde se mantiveram na instrução até serem abatidos em 1978 enquanto que a Base de Tancos manteve alguns dos aviões destinados ao treino operacional, também até 1978.
No segundo semestre de 1978, dos 257 T-6 das várias versões recebidos por Portugal, constavam somente 15 no efetivo da FAP.
Dessas aeronaves o Museu do Ar é detentor de sete, duas das quais em condição de voo. Também a Aero Fénix é detentora de quatro dos T-6 que serviram a FAP e outros encontram-se espalhados pelo Mundo.
FICHA DA AERONAVE
GERAL:
  • ANO DO PRIMEIRO VOO: 1935
  • PAÍS DE ORIGEM:  EUA
  • PRODUÇÃO:  ~+ 21.000 (numero aproximado, incluindo todas as variante)
  • PAÍSES OPERADORES: EUA, Argentina, Austria, Bélgica, Biafra, Bolívia, Brasil, Camboja, Canadá, Chile, Colômbia, Cuba, Dinamarca, República Dominicana, El Salvador, França, Gabão, Alemanha, Grécia, Haiti, Hong Kong, Honduras, Índia, Indonésia, Irão, Israel, Itália, Japão, Katanga, Líbano, Coreia do Sul, Laos, México, Marrocos, Países Baixos, Moçambique, Nova Zelândia, Noruega, Nicarágua, Paquistão, Paraguai, Filipinas, Portugal, Africa do Sul, Rhodesia do Sul, Vietname do Sul, Arábia Saudita, Espanha, União Soviética, Suécia, Suíça, Síria, Tailândia, Tunísia, Peru, Reino Unido, Uruguai, Venezuela, Jugoslávia, Zaire
ESPECIFICAÇÕES DE VARIANTE 
  • VARIANTE: T-6G
  • FUNÇÃO:    Instrução
  • TRIPULAÇÃO:  2
  • MOTOR:  1 x Pratt & Whitney R-1340-AN-1 Wasp, 600cv
  • PESO VAZIO: 1886 (kg)
  • PESO MÁXIMO NA DESCOLAGEM:  2546 (kg)
  • COMPRIMENTO: 8,84 (m)
  • ENVERGADURA: 12,81 (m)
  • ALTURA: 3,57 (m)
PERFORMANCE
  • VELOCIDADE MÁXIMA:  335 (km/h)
  • RAIO DE COMBATE: 1175 (km)
  • TETO MÁXIMO:  7400  (m)
ARMAMENTO
  • FIXO: 
Sem armamento de serie.

  • CARGA BÉLICA:
Muitas unidades, foram posteriormente, adaptadas para transportar sob as asas, bombas, casulos de foguetes ou de metralhadoras para realização de missões COIN.

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