sexta-feira, 30 de abril de 2021

MISSÃO DE BUSCA E SALVAMENTO do DO-27 3342


LESTE DE ANGOLA 28 de Janeiro de 1973:

Algures a Sul do AR de N’riquinha, o DO-27 3342 tripulado pelo Alf. Pil. Vinhas e o MMA Macedo aterrou de emergência por falta de combustível.
No AR Luso, o Comandante da Esquadrilha Cap. Pilav. Neto Portugal mandou chamar-me para me informar da ocorrência e de que na madrugada seguinte seguiria para o AR de N’riquinha integrado numa missão de busca e salvamento.
Com a incerteza de sucesso rápido inerente a este tipo de missões, ficou também decidido que devia ir preparado para ficar no AR do Cuito Cuanavale a substituir o MMA Macedo.
O início da missão foi marcado para as 06:00.
Pelas 05:30 o transporte da Base recolheu-me junto da “República” onde vivia, (nessa altura a FAP não tinha alojamentos para os seus militares pelo que todos viviam na cidade do Luso em Repúblicas, casas e quartos alugados).
No referido transporte já vinham os outros elementos afectos à missão, Cap. Pil. Acabado, Fur. Pil. Ramos e um Sarg. Electricista.
No AR após inspecção ao Beechcraft C-45 feita pelo Fur. Pil. Ramos e Mecânico de Dia, o Cap. Pil. Acabado pôs os motores em marcha, rolou e por fim descolámos. Eram 06:00.
Subimos até aos 6 000’ em direcção ao AR de N’riquinha. Durante a fase de cruzeiro, olhando para o terreno, recordo o nevoeiro que cobria os vales dos rios.
Pelas 08:00 aterrámos no destino.
Para que o sucesso da missão ocorresse no mais curto espaço de tempo, recordo que o desaparecimento tinha ocorrido no dia anterior, o Cap. Pil. Acabado e o Fur. Pil. Ramos tentaram obter mais informações sobre o voo do avião desaparecido, e também, sobre o real estado do passageiro que era para ter sido evacuado no dia anterior na missão interrompida.
Felizmente, que a razão da evacuação não era de causar maiores preocupações, pelo que, devido à incerteza da localização do avião e à previsível extensão da área de busca, atrasou-se a referida evacuação para que todas as aeronaves que fosse possível afectar à missão, ficassem disponíveis.
Assim, um DO-27 do AR de Gago Coutinho, com o Alf. Pil. Jorge Patrício e o Fur. Pil. Teixeira foi deslocado para o AR de N’riquinha a fim de participar nas buscas.
Também foi destacado para esta missão um Alouette III que se encontrava numa missão de apoio a uma operação em Mavinga, tripulado pelo Alf. Pil. José Carvalho e MMA Gião.
Entretanto fui preparando o Beechcraft C-45 para a missão de busca, abastecendo-o de combustível, verificando os níveis de óleo e tudo o mais que faz parte dessa preparação.
Aeronaves preparadas e informações recolhidas, foram iniciadas as buscas, orientadas primariamente para Sul de N’riquinha até às proximidades da Coutada do Mucusso por ser previsivelmente nessa área que se encontraria o avião com os seus ocupantes.
O tempo foi decorrendo sem sinais do avião.
Decorridas já duas horas, eis que o Alf. Pil. José Carvalho dá o alerta. Avistou o DO-27 e informou que ía aterrar junto dele.
Passados alguns minutos também o Alf. Pil. Jorge Patrício avistou o avião.
O "passageiro", Gião, Vinhas e Macedo


Felizmente a tripulação e o passageiro estavam “em bom estado” e o avião também.
Sobrevoámos também o local, e mais tranquilos regressámos ao AR de N’riquinha.
Era preciso agora abastecer o avião aterrado no mato e alimentar os estômagos das almas que ali pernoitaram.


Ao AR de N’riquinha tinha chegado, entretanto, um outro Alouette III vindo do Ninda e pertencente ao AR de Gago Coutinho, cuja tripulação não recordo na sua totalidade, apenas o MMA Peixeiro. Neste helicóptero colocámos bidons de combustível, água e comida para ir “reabastecer” homens e máquina.
Após a recuperação, o 3342 voa rumo a N´Riquinha devidamente acompanhado





O OUTRO LADO DA MESMA HISTÓRIA

Dia 27 de Janeiro de 1973:

Missão TEVS a N’Riquinha. Evacuar um elemento do Exército e no voo de ida levar como passageiro um outro militar.
Devido ao mau tempo não conseguimos aterrar no destino, pelo que voámos para Mavinga onde aterrámos, o avião foi reabastecido e regressámos ao Cuito Cuanavale.

Dia 28 de Janeiro de 1973:

Objectivo: efectuar a missão TEVS não realizada no dia anterior.
Avião preparado, tripulação e passageiro a bordo e aí vamos. Alinhado na pista, 15° de Flaps, fuel pump ON, full power e descolámos, de novo directos a N’Riquinha.


Aos 7 000’ nivelámos, potência de cruzeiro. Passámos Dima. Após cerca de uma hora de voo avistámos Mavinga. Passámos à vertical e continuámos para o destino.
Eis que ao longe na nossa rota começaram a ser visíveis cumulus e cumuloninbus com actividade eléctrica e chuva.
Comecei a desviar para Norte na tentativa de contornar a tempestade, só que esta parecia perseguir-nos.
Subi para os 9 000’ mas a turbulência aumentou significativamente.
A leitura do terreno deu-me a indicação que estaríamos à vertical de N’Riquinha, mas não era visível.
Contornei a tempestade voando para Sul/Oeste com os cuidados necessários para não entrar em território Zambiano, mas a tempestade não abrandava e o combustível começou a ficar curto...
Sem sucesso no objectivo de aterrar em N’Riquinha, e também na tentativa de encontrar uma alternativa, com o combustível a entrar na Reserva. Consultado o MMA Macedo, tornou-se prioritário encontrar um terreno amplo que permitisse uma aterragem de emergência.
Encontrada uma aberta nas nuvens, vislumbrámos um terreno propício para uma aterragem de emergência.
Ao passageiro foi dito para se segurar pois íamos aterrar num terreno que não era propriamente uma pista... O homem não se segurou nem ás águas que verteu pelas pernas abaixo.
Em HF declarei emergência. Respondeu a BA9. Transmiti que ia aterrar de emergência por falta de combustível e as coordenadas aproximadas da nossa posição.
Iniciei a aproximação, reduzi a velocidade, 30° de Flaps, Fuel Pump ON e aí vamos. Contacto com o chão, mais outro contacto, a cortar capim, mais uns solavancos e lá parámos de frente a umas árvores. Eram 16:30.


Saímos do avião.
O passageiro deveras aflito, pois nunca tinha estado no mato! Preparámos as nossas armas para o que desse e viesse. Ficámos alerta. Tentámos reconhecer o terreno. Nem homens nem animais. Estávamos sózinhos.
Voltámos para o avião. Liguei o rádio HF, antena estendida e chamei de novo quem nos ouvisse para transmitir a nossa situação. A BA9 ouviu-nos e perguntou sobre a nossa situação. Transmiti que tínhamos aterrado e que o avião, tripulação e passageiro estavam bem.
O sol, entretanto, começou a desaparecer no horizonte e a nossa inquietação aumentou. Ninguém dormiu. Fizemos turnos de vigilância. Assim passámos a noite ouvindo ao longe a tempestade e os barulhos dos animais, uns mais perto, outros mais longe, mas nenhum nos “visitou”.
06:00. O Sol a brilhar, a ansiedade e o calor a aumentar e a fome a apertar. As rações de combate tinham sido consumidas ao “jantar”. A água tinha acabado.
As horas custavam a passar. Nenhum indício de busca, mas sempre com a esperança de que nos iam encontrar. E encontraram!
Equipa de recuperação: Araújo, Tex, Patrício, Peixeiro, Cabaço, Rosado, Abreu, Raul Carolo  e Fernando Duarte - Foto de Fermelindo Rosado



Por:




 


quinta-feira, 22 de abril de 2021

A PAZ E O AMOR DEVEM ANDAR SEMPRE DE MÃOS DADAS!


E passo a explicar: Eu era furriel miliciano Foto Cine, em missão de serviço, colocado na linda cidade de Nampula. Cheguei em Fevereiro de 1972 e estive nesta cidade até 12 de Abril de 1974.
Embora militar o meu desejo era que houvesse Paz em Moçambique e sobretudo no Mundo, como acontece ainda hoje.
Nampula


Pensei criar uma imagem em que a PAZ se sobrepusesse à Guerra e "construí" no estúdio da Foto Cine, em Nampula, à noite e (sem conhecimento dos meus superiores), esta imagem, tendo comprado uma pomba branca que coloquei em cima da minha bota da tropa, devidamente engraxada.
Este secretismo tinha a ver com o facto de não vivermos em Liberdade, uma vez que o 25 de Abril iria acontecer 2 anos depois.
Para a época era uma foto subversiva. Feita a fotografia e depois de revelar os negativos, guardei-os religiosamente comigo até vir para a Metrópole, o que aconteceu uns dias antes do 25 de Abril de 1974. Ainda, naquela noite, passei junto a um quintal arborizado e deixei a pomba em liberdade.
Para vocês perceberem quanto eu desejava a Paz na Humanidade, (ver foto em baixo) usava ao pescoço, quando estava vestido à civil um amuleto que era, e é , o símbolo do MAKE LOVE NOT WAR. Afinal o Festival de Woodstock, tinha acontecido apenas há 3 anos. Esta foto foi feita pelo meu colega Foto Cine, Jorge Ribeiro, na concorrida piscina de Nampula. Gosto imenso da foto da Paz sobre a Guerra!
A PAZ E O AMOR DEVEM ANDAR SEMPRE DE MÃOS DADAS!
















Por:
João Marques Valentim

quinta-feira, 8 de abril de 2021

O PARTO DA ISABEL KATOMBÉ - UMA HISTÓRIA DE VIDA.


Acabara de descolar do Alto Chicapa, pequena povoação na Lunda Sul, onde fui levar alguns medicamentos com carácter de urgência, para os militares do exército ali estacionados. Dada a hora, cerca das 11H30, fui convidado pelo comandante do destacamento, para almoçar no pequeno quartel que abrigava os 25 militares destacados no local.
Depois de agradecer o convite, amavelmente recusei, pois o Esteves, mecânico que me acompanhava, tinha um almoço de aniversário de um camarada, marcado para as 13H00 no Luso, cidade que albergava todas as tropas operacionais de todas as especialidade no Leste de Angola.
Subi até aos 1.500 pés acima do solo, estabilizei o avião e introduzi o rumo do Luso. Contacto a sala de comunicações:
--Luso!... Paquito (meu indicativo operacional) chama.
--Paquito, Luso escuta.
--Descolei Alto Chicapa, chegada prevista para as 12H40.
--OK Paquito, informe a 10 milhas em aproximação.
O Esteves era e é, felizmente, um apaixonado do prato cheio. Ainda hoje, nas tertúlias que habitualmente frequentamos em diversos lugares do país, só vemos o Esteves a sorrir de felicidade, quando a terrina lhe fica a jeito. Contudo, há que dizê-lo, este meu companheiro de muitas aventuras, pratica ténis amador desde alguns anos a esta parte na zona do Porto-Gaia, o que faz com que na sua idade mantenha uma forma física apreciável. Por esta razão costumo tratá-lo carinhosamente por Federer de Avintes
--Porreiro pá, vamos chegar mesmo à hora do almoço.
Olhei-o de soslaio através da viseira do capacete e notei um leve sorriso de satisfação nos seus lábios, como se já estivesse a saborear o cabrito que fazia parte da ementa.
--Porreiro para ti...eu estou de prevenção. Vou almoçar na cantina da base uns carapaus fritos e já gozo.
--Aparece lá para o jantar, a festa deve durar até às tantas.
--Talvez, logo se vê como acaba o dia.
Tinham passado dez minutos desde a descolagem e eis uma comunicado:
--Paquito... Paquito... Luso chama.
--Paquito, escuta transmita.
--Por ordens do comando, deve alterar a rota para o Dala. Evacuação de um civil.
--OK Luso, assim farei!
Já nos lixaram, atirou o Esteves em português vernáculo, como que a pressentir que o cabrito já era...
Já te lixaram, queres tu dizer, atirei com ar Irónico.
A mim não me afecta nada aliás, o Dala já está ali à vista, mais doze minutos e estamos lá!


O Dala era uma linda cidadezinha, conhecida por umas quedas de água deslumbrantes que ficava a cerca de 90 Klm do Luso, a leste do local donde eu tinha descolado anteriormente. Como estava próximo, o comandante operacional entendeu que não havia necessidade de ir outra aeronave fazer a evacuação, já que o meu avião estava equipado para este tipo de missões e ganhava-se tempo com esta decisão.
No Dala e pelas informações que recebi via radio, já tudo e todos estavam prontos para a chegada do avião.
Depois de sobrevoar o rio e as quedas de água referidas anteriormente já a baixa altitude, iniciei uma volta apertada, entrei directamente na final e aterrei. Dirigi-me para a placa de estacionamento, onde pude ver à distância uma ambulância militar e seis ou sete pessoas entre elas duas freiras. No Dala, havia uma congregação religiosa e social num agradável edifício que, para além do ensino a crianças, assistiam na área da saúde a população local e em outras acções de auxílio humano como a pobreza.
Quando parei o avião, mantive-me sentado na carlinga, abri a porta e enquanto os enfermeiros do exército, com a orientação do Esteves, instalavam o doente no interior do avião, surgiu perto de mim uma freira de meia idade, dizendo-me com uma voz calma e sorridente que a Isabel Katumbé, estava com sintomas de parto prematuro e agradeceu a minha louvável missão de transportar a Isabel para o hospital do Luso.
Já me tinham comunicado ainda em voo, que o evacuado era do sexo feminino, mas da particularidade de que era uma grávida de nada me informaram.
--Irmã, não tem que agradecer, é minha obrigação ajudar como a de todos os meus companheiros da FAP sempre que estamos de prevenção a este tipo de missões. Mas não seria melhor, alguma das irmãs acompanhar a parturiente?
--Não é necessário, a Isabel é jovem e forte e vai esperar sem problemas até chegar ao Luso. Que Deus vos acompanhe!...
Acenou um adeus com as mãos e apressada, contornou o avião para apertar e beijar a mão da Isabel Katombé, que já estava pronta para eu poder descolar.
Vamos, disse o João enquanto apertava o cinto e colocava e os auscultadores. Com um bocado de sorte ainda chego a tempo do almoço. Não lhe respondi, a partir de agora, pelo respeito que sempre tive pelas dezenas doentes e feridos que evacuei, era imperioso chegar ao Luso o mais rápido possível.
Enquanto rolava para a pista, olhei para trás. A cabeceira da maca neste tipo de avião, ficava muito perto do intervalo entre as cadeiras do piloto e do mecânico. Vi que a jovem mulher tinha o corpo coberto com um lençol de cor azul celeste, e que os seus olhos se voltaram para mim molhados de alegria. Levei o braço atrás e dei-lhe uma palmadinha no ombro, tentando dar-lhe a entender que tudo ia correr bem e que estivesse calma.
Um minuto depois da descolagem , eis-nos em direcção ao Luso.
Quando já em velocidade de cruzeiro e cerca de dez minutos de voo, de relance, pareceu-me ver uns movimentos bruscos no corpo da evacuada. Olhei e vi-a de braços a abanar na nossa direcção.
--Esteves, tira os auscultadores e vai lá para trás ajudar a mulher que ela está com problemas.
--Eu?... Mas que posso eu fazer!
--Mais do que eu, que não posso largar os comandos.
--Bom, está bem, pelo menos seguro-lhe as mãos.
De imediato comuniquei com o Luso e peço um médico com urgência na sala de operações para nos dar alguma ajuda na maneira em como o Esteves devia agir.
--OK, Paquito, vou tratar já disso, a equipa médica já está à espera na placa de estacionamento. Vou mandar chamar o médico.
Entretanto a Isabel, já tinha tirado o lençol e vi o Esteves a segurar-lhe as pernas meio atarantado sem saber o que fazer.
Eu, ansioso, esperava que o médico entrasse em contacto rápido comigo. O Esteves, bate-me no ombro e com ar aflito e diz-me que a maca está toda molhada e que não sabe o que se passa.
Espera!...
--Paquito o médico está a ouvir, pode comunicar.
Expliquei-lhe meio a gaguejar a situação duma maneira geral.
O Dr. Assis disse-me o que poderíamos fazer e perguntou-me o tempo previsto para a chegada.


--Já tenho o Luso à vista, mais oito minutos estou com rodas no chão.
--OK, tenham calma e resto de bom voo, estamos preparados à vossa espera.
Fiz sinal ao Esteves para chegar perto de mim. Como ele não tinha auscultadores, tinha de falar alto para ser audível por entre o barulho do motor.
--O médico disse para pôr uma almofada ou algo idêntico por trás da barriga da mulher, segura-lhe nas mãos e diz-lhe para respirar fundo e espaçadamente fazer força.
--OK, vou já tratar disso. Como não havia almofada, o Esteves agarrou na caixa de ferramentas, enrolou-lhe uns desperdícios de oficina o colocou-a no fundo das costas da mulher.
Neste momento já tinha a pista do Luso à vista, comuniquei a minha posição e recebi a indicação que a partir desse momento tinha prioridade sobre qualquer outra aeronave que estivesse na zona de aterragem.
Júlio! Berrou-me o Esteves ao ouvido. O puto já está com cabeça quase toda de fora. É vermelhinho, parece um índio.
--Deixa lá agora a cor da criança. Vai lá para trás ajudar e segura-te, como vês já, estamos na final para aterrar.
--Puxa, ainda bem!...
Um minuto depois estava no chão a dirigir-me para a placa onde uma equipa militar de saúde esperava pronta a intervir.
Logo que parei e desliguei o motor, o médico e um enfermeiro entraram de rompante e tomaram conta situação.
O resto do parto consumou-se dentro do avião na placa de estacionamento.
Naturalmente, que eu e o Esteves assistimos sentados nos nossos lugares à intervenção médica.
Foi emocionante ver o enfermeiro mostrar o bebé à mãe Isabel.
Desaperto os cintos e saio do avião. Acompanho a entrada da mamã e do bebé na ambulância. Chego-me perto e toco na mão da Isabel como gesto de despedida. Olhou-me com ar cansado mas carinhoso. Apertou com muita força a minha mão e mostrou um leve sorriso. Com o polegar fiz-lhe sinal de OK.
Missão cumprida!
Quando voltei ao avião para recolher o material de voo, já não vi o Esteves.
Soube umas horas mais tarde que ainda chegou a horas de encher a pança de cabrito assado.
__//__
A Isabel Katumbé tinha 17 anos feitos há um mês.
Os bebés negros nascem mesmo vermelhinhos.
Aconteceu na Lunda Sul e Moxico, Leste de Angola em Junho de 1973.
Avião Dornier-27, número de asa FAP 3330. Por:






Júlio Corredeira

quinta-feira, 1 de abril de 2021

EVACUAÇÕES PELA FAP, ATÉ DE "INIMIGOS".



Em 1966 ou 1967 não me recordo bem, na N´Riquinha, surgem três homens, um deles amparado pelos outros dois, num estado lastimoso, eu mal o vi, deu-me a impressão de que respirava por "um buraco" nas costas, ali pela zona da omoplata... Vinham então pedir ajuda "da tropa"...e a história, contavam os dois que amparavam o ferido era de que um leão lhes dizimava a manada do gado, mas que eles perseguiram o leão e que o haviam morto mas que na contenda o leão atingira aquele nas costas e estava naquele estado, imaginava-se a morrer a qualquer momento. O nosso comandante, o saudoso Capitão Bandeira (da C.Caçadores 1521), disse-lhes: - "nós vamos tratar dele mas, quero ver a cabeça do leão". Os homens saíram correndo, tudo se havia passado na zona de Santa Cruz (do Cuando), na altura já se falava que haviam grupos da Unita que andavam por ali, e a ideia de que se teve de imediato, era de que "aquilo" tinha a ver com a actividade desses grupos. Imediatamente foi pedida uma aeronave para evacuar o homem. Não posso precisar mas passado algum tempo, talvez umas horas, chegou um PV2, recordo-me que era comandado por um Tenente que ao ver o pobre homem, como digo, dava a impressão de respirar pelas costas, olhou para o nosso Capitão com cara de poucos amigos e perguntou: - "vale a pena levá-lo"? Ao que o nosso capitão respondeu afirmativamente.
A historieta acabaria aqui, não fosse que dois dias depois os dois homens apareceram no nosso aquartelamento com a cabeça do leão abatido, já o outro estava no Luso e nada se sabia. O tempo passou, talvez um mês ou mais e numa segunda feira, no semanal voo do Noratlas, lá veio o homem que tinha sido evacuado no PV2. Vinha do Luso, do hospital, risonho e contente, tinha sobrevivido. Não era amigo nem inimigo, era um humano. A FAP fez o que pôde e ele salvou-se. Organizou-se uma patrulha para o levarem a Santa Cruz, quase a cem quilómetros, que os seus amigos fizeram pelo menos 4 vezes a pé, mas salvaram-no!
Por Diogo Sousa Cª. Caç. 1521