Quando em Abril de 1974 aconteceu a revolução que viria a
transportar-nos para o regime político que hoje vivemos, Portugal
travava nas longínquas terras Africanas uma guerra em três frentes.
As Forças Armadas Portuguesas (FAAs), tinham ao tempo nas suas fileiras
um estrondoso número de duzentos e quarenta e três mil homens em armas.
Digo homens, porque as mulheres, exceptuando o honroso Quadro de
Enfermeiras Paraquedistas, não integravam as fileiras.
Hoje ano de 2017 as (FAAs) têm nas suas fileiras vinte e oito mil militares.
O diferencial tem como razão principal o fim da guerra em África, com a
consequente alteração do dispositivo por um lado, e por outro, o fim do
Serviço Militar Obrigatório (SMO).
As praças actualmente existentes
nos três ramos das (FAAs),são contratadas em regime de voluntariado,
tendo uma missão muito específica comparativamente àqueles que serviam
no (SMO).
A propósito do (SMO), convém relembrar que jovens oriundos
do mundo rural, sem frequência escolar, vinham às fileiras tendo a
organização militar por razões que se prendiam com a sua missão, o dever
de lhes ministrar conhecimento no âmbito da personalidade e carácter.
Quantos chegavam para «ASSENTAR PRAÇA» como ao tempo se dizia, alguns
sem saber ler, sem nunca ter visto o mar, sem nunca ter viajado de
comboio e muito menos de avião.
A instituição militar procedia à moldagem e ao ensinamento!
Muitos fizeram a quarta classe enquanto cumpriam o serviço militar obrigatório!
Muitos obtiveram a carta de condução enquanto cumpriam o serviço militar!
Muitos aprenderam profissões que nem sabiam existir!
Aprenderam a ser rigorosos e cumpridores!
Aprenderam regras de respeito e disciplina!
Aprenderam a ser pontuais!
Aprenderam a andar devidamente ataviados!
Para além do que precede e é muito, cumpriam a missão de cidadania,
jurando defender a Pátria, mesmo com o sacrifício da própria vida.
Aqui chegados, surge pois a confrontação da missão das (FAAs),no
contexto externo face a compromissos internacionalmente assumidos, que
projetam o nome de Portugal para vários continentes.
Temos responsabilidades internacionais assumidas!
UNIÃO EUROPEIA
NATO
NAÇÕES UNIDAS
CPLP
Os nossos militares têm percorrido os difíceis caminhos do
Afeganistão, Kosovo, Líbano, Bósnia, Chade, Congo, França, Mali, Iraque, Timor
Leste, entre outras paragens, numa perfeita e reconhecida projecção externa de Portugal e do seu povo.
Com o cumprimento destas missões,
as (FAAs), têm ainda a missão primária de internamente ser um pilar
essencial da Defesa Nacional, constituindo a estrutura do Estado,
garantindo a defesa militar da República.
Findo o (SMO),em 2004 como
atrás referido, as unidades e estabelecimentos militares ficaram
espoliados da mais valiosa e vital componente, aquilo que agora se
designa de recursos humanos.
Não existe o Quarteleiro, não há lugar
para o Plantão, Faxinas nem vê-los, Sentinelas onde estão? As unidades
ao fim de semana estão completamente vazias, apenas se verificando a
presença do pessoal de serviço. Verifica-se nesses dias a movimentação
de viaturas civis pertencentes a empresas que tratam da alimentação, dos
bares, das limpezas e calculem, nalguns casos, a segurança de
estabelecimentos militares.
Já vai longa e maçadora esta introdução, mas acreditem que estou quase a chegar a Tancos, para descrever o cenário acontecido.
PARA QUEM SE LEMBRA:
SENTINELA NO POSTO DE VIGIA:
SENTINELA AVISTA UM VULTO!
SENTINELA ARMA EM RISTE E BALA NA CÂMARA!
SENTINELA AVISA: QUEM VEM LÁ FAÇA ALTO!
VULTO RESPONDE: A RONDA!
SENTINELA MANDA AVANÇAR AO RECONHECIMENTO!
VULTO AVANÇA!
SENTINELA MANDA PARAR!
SENTINELA PEDE SENHA!
VULTO INDICA A SENHA!
SENTINELA MANDA AVANÇAR!
RONDA PEDE CONTRA SENHA!
SENTINELA E RONDA JUNTAM SE E CONVERSAM!
RONDA INTERROGA DA SEGURANÇA!
SENTINELA INFORMA TUDO NORMAL!
RONDA DESPEDE-SE COM VOTOS DE BOA GUARDA!
O posto de vigia, a sentinela e a ronda estão sintonizadas no objectivo comum!
Não teriam «voado» disparadores de tração, granadas, granadas antitanque,
explosivos plásticos, iniciadoresIKS, lâminas KSL, munições de 9mm, bobinas
de fio, disparadores de tração lateral etc, se um sistema de segurança
como o descrito estivesse activado!
A defesa como função de soberania
tem vindo a ser descurada. Face aos factos, construindo uma legislação
flexível, por forma a salvaguardar carreiras profissionais ou
académicas, não seria desejável para bem do País e dos nossos jovens,
reintroduzir o Serviço Militar Obrigatório?
COMO FOI POSSÍVEL CHEGAR AQUI?
Os Governantes dos vários governos nunca viram com bons olhos os
militares, aqueles que lhe deram o poder em bandeja de prata. Oriundos
das «jotas», nunca tiveram necessidade de fazer recruta e especialidade,
nunca participaram no «render da parada”, nunca fizeram reforço nem
rondas, não precisando de fazer juramento perante a Pátria.
Quando
aos militares em missões de paz projectam garbosamente o nome de
Portugal, os políticos aparecem para colher louros, pouco lhe importando
com a forma e o profissionalismo como tal acontece.
Assim sendo,
vão cortando nos orçamentos, vão reduzindo no pessoal numa postura de
total alheamento, relativamente às dificuldades da instituição militar.
Os políticos têm a maior parte das responsabilidades do que em Tancos se passou!
O Senhor Ministro da Defesa fica novamente mal na fotografia. Quem não
se lembra de uma polémica originária do Colégio Militar que obrigou um
General muito prestigiado a demitir-se. Falo do Senhor General Carlos
Jerónimo. Está mais que provado que este Ministro da Defesa não tem
perfil adequado à função que desempenha, devendo ponderar a sua
continuidade governativa.
QUANTO AOS MILITARES RESPONSÁVEIS PELA SEGURANÇA DOS PAIÓIS:
No que às responsabilidades operacionais diz respeito, começo por
discordar da diluição do conceito de protecção aos paióis, repartida
entre os cinco Comandantes de Unidades possuidoras de armamento no mesmo
local.
Este modo contraria o princípio de comando único o mais desejável em situações como a presente.
Como é possível sem câmaras de vigilância nem guardadores de proximidade, passarem vinte horas sem qualquer ronda?
Qual dos Comandantes reportou, se reportou, a inoperatividade do sistema de vigilância?
Qual dos cinco Comandantes assumiu ou assume a responsabilidade da
falta de pessoal para manter a segurança próxima e a fragilização
operacional das rondas?
Algum dos cinco Comandantes pôs o lugar à
disposição, face ao facto de não possuir condições de guarda de algo tão
importante como os paióis nacionais de Tancos?
O Senhor General
Chefe do Estado-Maior do Exército tem poder para demitir ou suspender
todos os seus subordinados. Creio como primeiro responsável por tudo o
que se passa no Exército Português, tendo em conta a gravidade de
Tancos, poderia e devia fazer um exercício introspectivo que certamente o
levaria a reflectir sobre a continuidade ou não nas funções.
Estou em fim de texto e neste momento tomo conhecimento da demissão de dois Generais do Exército. As coisas complicam-se!
Por:(Ten Coronel na reforma)
Sem comentários:
Enviar um comentário