sexta-feira, 25 de novembro de 2016

MISSÃO NO LAGO DILOLO

O relato seguinte tem por intenção abrir um pouco a questão de como pensavam os intervenientes naquela guerra. Seria interessante abrir o diálogo com alguns familiares mais jovens que por aqui andem, alguns mentalizados de forma alheia às situações, Acho e entendo que nós os que participámos naquela guerra temos alguma coisa a dizer, a nossa opinião, sujeita a análise e a críticas se for caso disso, mas a nossa opinião. Não sou belicista porque fiz a guerra, mas também não sou pacifista, porque os pacifistas atraem as guerras.
Luacano 1969-foto de Pereira Rodrigues
Desloquei-me do Luso no avião do CFB, que o Cmdt do Batalhão usava como táxi para o Luacano, povoação ao longo da linha do CFB a meio caminho entre o Luso e Teixeira de Sousa. Era uma pequena povoação, mas com uma grande avenida, a principal actividade era a captura de pequenos peixes que viviam nas anharas e zonas alagadiças, charcos e pequenos rios da chana.No dia seguinte de manhã preparava-me para seguir com o comandante do batalhão no
Lago Dilolo-foto de Julio Corredeira
helicóptero para o posto de comando avançado planeado para o Lago Dilolo, quando o major que o acompanhava me dá uma ordem: - Monteiro, leve os seus homens para o Lago Dilolo!
Não estava nada à espera disto, primeiro porque não era operacional, a minha responsabilidade eram as transmissões, segundo porque não podia contestar a ordem e lá estou eu a comandar uma coluna militar de quatro ou cinco viaturas em direcção ao Lago Dilolo, a comandar “os meus homens”, homens sim, com uma média de 21 anos numa missão militar em zona de guerra.
Lembrei-me de alguns relatos que ouvira em Mafra sobre estas situações, na verdade eu era mais um estudante mobilizado para uma missão militar, que um chefe militar, mas estava ali agora com a missão de levar aqueles homens até ao Lago Dilolo. Em primeiro lugar tinha de demonstrar segurança, que a pior coisa que um chefe militar pode fazer perante os “seus” homens é mostrar insegurança. Aqueles homens, em caso de algum ataque ou situação de risco, esperavam que eu soubesse tomar as medidas e as atitudes certas, mas eu não estava assim tão certo, nada podia demonstrar dessa insegurança e lá fomos direitos ao pó da picada.
Armando Monteiro
De repente lá estou eu, estudante em Lisboa a comandar uma missão militar em África, a saber pela primeira vez o que era o pó da picada, As viaturas avançam sem capotas por causa das minas, se alguma rebentar é mais seguro ser lançado ao ar que ficar esmagado contra o teto da capota. A zona era plana, de savana, embora os angolanos usem mais o termo anhara para designar este tipo de terreno. Uma viatura atascou pelo caminho e lá aproveitei para mais uma fotografia, a cara cheia do pó da picada, mas lá levei os “meus homens” até ao Lago Dilolo, o maior lago de Angola.
Durante a minha estadia o alferes comandante do destacamento, contou-me que tinham sido atacados uns tempos antes. Organizada a defesa um dos soldados pegou no morteiro 60, nestes casos era só usado o tubo do morteiro, de modo a torná-lo mais manejável, aponta mais ou menos para a zona onde estavam a ser disparados os tiros e enfia pelo cano abaixo uma granada de morteiro, grande estrondo e lá vai granada, aquilo ia ensinar aos outros para não se meterem com o pessoal do destacamento, de repente o céu fica iluminado e lá vem uma estrelinha brilhante a descer lentamente de para-quedas, iluminando o cenário.
Coisa estranha, que era aquilo? E vai mais morteirada, e nova luz a iluminar o cenário… os guerrilheiros foram-se embora, estavam ali para fazer um ataque a sério e o pessoal do destacamento a lançar foguetes, como se a guerra fosse a brincar! Foram fazer a guerra para outro lado, estes eram uns brincalhões, não levavam as coisas a sério.
Verificadas as coisas, chegou-se à conclusão de que todas as granadas de morteiro existentes eram de iluminação…foi uma guerra bonita em que ninguém ficou ferido, afinal todas as guerras deviam ser assim.
Regressei ao Luso de Heli.

Por:



Armando Monteiro
Alf.Mil.Transmissões Bat.Caç. 3831

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