quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

P2V-5 NEPTUNE Nº4711, NO ULTRAMAR

Na BA9 - Luanda

OPERAÇÕES EM ANGOLA
Com a solução, ainda pendente dadas as limitações de emprego fora do âmbito geográfico da NATO, de colocar definitivamente os P2V-5 na BA12 em Bissalanca, a Esquadra 61 vê-se envolvida em mais um teatro de operações.
A partir de 1964, uma nova missão na 2ª Região Aérea, na BA9, em Luanda, levaria os P2V-5 a assumir uma presença contínua em Angola sob a forma de Destacamento 62.
O primeiro voo do “4711” é efectuado no dia 17 de Junho de 1964, pelo Capitão Piloto-Aviador José Nolasco Martins, a desempenhar as chamadas missões de soberania no vasto território angolano.
No AB4 (leste de Angola) 
Uma vez mais, a autonomia destes aviões que se estendia às 12 horas de voo, permitia à Força Aérea Portuguesa manter uma presença fiscalizadora, não só em ambiente marítimo, onde controlava o tráfego junto aos portos, mas também em áreas como as “terras do fim do mundo”, no Leste e Sul numa constante monitorização às actividades subversivas.
Até final de Agosto, a operação dos P2V-5 a partir de Luanda teve uma taxa de prontidão elevada, sendo possível verificar que as missões desempenhadas eram quase diárias, reflexo do grande esforço que as equipas de manutenção desenvolviam. No dia 3 de Setembro termina a primeira fase do Destacamento 62 para o “4711”, iniciando nessa data o voo de regresso que o levaria a efectuar escalas em São Tomé e Sal, antes do destino final, a Base do Montijo.
Em 16 de Novembro de 1964, dá início a novo Destacamento 62, com permanência na BA9 até 19 de Fevereiro de 1965, data em que inicia o voo ferry de regresso à Metrópole. 
Ao longo do restante ano o “4711” é rendido por outros P2V-5 nas suas já habituais migrações a territórios ultramarinos. 

ENTRE ANGOLA E MOÇAMBIQUE
Decorria o ano de 1965 quando, fruto da instabilidade política vivida nos países vizinhos de Moçambique – motivada pela independência concedida pelo Reino Unido à Rodésia do Norte (actual República da Zâmbia) e pela declaração unilateral de independência por Ian Smith a igual estado de emancipação da República da Rodésia (Zimbabwe) – o Comando da 3ª Região Aérea avançou com a ideia de que uma deslocação de aviões P2V-5 de Angola para Moçambique seria uma opção estratégica preferencial face aos desenvolvimentos políticos em curso.
Por sua vez o Comando da 2ª Região Aérea formalizava algumas objecções relativas à possível transferência daqueles meios aéreos para Moçambique. Reiterando a tese de que do ponto de vista operacional, embora dotado de excelente maneabilidade, o P2V-5 não seria o avião indicado para a vigilância das margens de rios e lagos, podendo neste caso sobrevoar territórios de outros países e assim criar incidentes internacionais e que a utilização do potente radar AN/APS-20 neste contexto seria completamente inútil. Acrescentando ainda que na eventualidade de uma acção de reconhecimento armado haveria ainda a ter em conta que as metralhadoras do dorso da aeronave estavam desmontadas ou inoperativas por falta de interruptores limitadores. Para além disso, o bombardeamento de área não seria possível ser efectuado com a eficácia desejada por falta do visor apropriado para largada de bombas em terra. Segundo esta fonte os aviões apenas seriam eficazes em ataques pontuais com foguetes de 5 ou de 2.75 polegadas. Outros factores, como as dificuldades de manutenção na 3ª RA, que seriam ainda mais complicadas do que as mantidas em Luanda, uma vez que a distância era um factor a considerar e que o habitual auxílio proporcionado pela TAP ou pelas OGMA em aparelhagens de teste, eram na 3ª Região Aérea inexistentes.
Caderneta de voo onde são referenciados voos
realizados em Dezembro de 1966,
pelo 4711, a partir da BA10 
Finalmente, o Comando da 2ª Região Aérea advogava que em Moçambique a Força Aérea Portuguesa dispunha de meios aéreos suficientes para esse tipo de missão, referindo a operacionalidade plena de seis aviões PV-2 Harpoon. A única limitação que estas aeronaves apresentavam era em relação à sua autonomia mas, mesmo esta, poderia ser aumentada com a utilização de “drop tanks” e tanque de cabine, conferindo-lhes assim uma autonomia de nove horas de voo.
Todavia e rejeitando a intervenção exposta pelo Comando da 2ª Região Aérea é determinado pelo Estado-Maior da Força Aérea, a constituição do Destacamento 63 para operar a partir da BA10 (Beira) sendo integrado na Esquadra 101.

BLOQUEIO NAVAL AO PORTO DA BEIRA – DESTACAMENTO 63
No dia 9 de Abril de 1966, foi decidido pelo Reino Unido e corroborado pelo Conselho de Segurança da ONU colocar em prática uma série de medidas de embargo, que incluíam um boicote político e sanções económicas, à auto-declarada independente República da Rodésia. Estas medidas implicaram um bloqueio naval ao porto da cidade da Beira, em Moçambique, com vista a impedir a entrada de navios com mercadoria essencial à subsistência da Rodésia. Na prática seria um bloqueio pouco efectivo, uma vez que o porto de Lourenço Marques continuava aberto e, assim, dissimuladamente, Portugal continuaria a fazer chegar apoios ao regime de Ian Smith que por sua vez assistia os militares nacionais na luta contra a Frelimo, particularmente na província de Tete.
A Royal Navy (Marinha Real Britânica) seria encarregada de constituir uma task force liderada pelo porta-aviões HMS Ark Royal e o seu grupo de combate com vista a implementar esta decisão. Pelas razões indicadas, a Força Aérea Portuguesa foi incumbida de contribuir com os meios aéreos disponíveis e que pudessem fazer frente a este embargo indesejado, mantendo assim a plena soberania do território.
Assim, foram inicialmente empregues para este fim aviões PV-2 Harpoon, que operavam na 3ª Região Aérea há dois anos e seis F-84G provenientes da BA9, em Luanda (Angola). Inseridos neste dispositivo de defesa estavam também dois aviões P2V-5. Estes viriam a preencher a lacuna de fiscalização nocturna no Canal de Moçambique, podendo também neste período proceder à detecção de indícios de movimentação dos meios navais ingleses, permitindo localizações frequentes de todos os navios, incluindo o porta-aviões HMS Ark Royal.
P2V-5 “4711” integrado no Destacamento 63 e estacionado na BA10 (Beira, Moçambique)

Toda esta movimentação de forças oponentes terminaria no final de Julho de 1966 sem que fossem registados quaisquer incidentes. A Rodésia manteve-se independente e os meios aéreos nacionais empregues nesta operação voltaram às unidades de procedência, com excepção dos P2V-5 que manteriam o Destacamento 63 activo até ao primeiro trimestre de 1967.
Retrocedendo ao início deste episódio e recorrendo uma vez mais a documentação existente no SDFA/AH, regista-se que a primeira aeronave P2V-5, oriunda da BA9 e incluída no Destacamento 62 foi enviada para a Beira no dia 3 de Janeiro de 1966, tendo regressado a Luanda a 25 de Fevereiro.
12 de Abril de 1966 é a data formalmente estabelecida como a de activação do Destacamento 63, sendo este inicialmente composto pelos P2V-5 Neptune “4704” e “4712”, aviões que tinham recentemente efectuado a revisão das 240 horas e, consequentemente, dispunham de grande potencial de voo. Seria também determinado que, de forma a evitarem-se desnecessárias deslocações dos P2V-5 à Metrópole para as revisões intermédias que de futuro seriam executadas na BA9, unidade que veria reforçados os seus meios de manutenção, poupando-se assim 20% das horas totais disponíveis para as operações aéreas. A partir do início de Setembro de 1966, o P2V-5 “4711” surge referenciado nas cadernetas de voo consultadas, como integrante do Destacamento 63, a operar a partir da BA10 (Beira) em missões de conhecimento Marítimo (RECMAR) ou, como habitualmente identificadas de RVIS – MAR (Reconhecimento Visual em Ambiente Marítimo). Depois de cumprida mais uma missão em territórios africanos, desta vez em Moçambique, o longo voo ferry de regresso à metrópole do “4711” é efectuado entre os dias 21 e 25 de Março de 1967, em cinco etapas diárias, com escalas em Luanda, São Tomé, Bissau e Gando, antes de aterrar no destino final, Base do Montijo.

REGRESSO À ZACVG
Em 1968 dá entrada nas OGMA, em Alverca, desta vez para efectuar a segunda revisão geral, que durou cerca de 15 meses, estando concluído no final de Janeiro de 1970.
Após o processo de regeneração do seu potencial de voo, o P2V-5 “4711” assume em pleno as missões da Esquadra 61. Entre estas, uma das mais importantes à data, era a de assegurar a presença na Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné (ZACVG) de um destacamento permanente de dois P2V-5.
No período de 1970 a 1973, o P2V-5 nº 4711 é presença regular no arquipélago de Cabo Verde, assegurando vários dos destacamentos, efectuados pela Esquadra 61 na Ilha do Sal (AT1), com uma duração típica de aproximadamente um mês, assegurados em regime de rotação pelas tripulações e aeronaves da Esquadra de Reconhecimento Marítimo.
Na BA12 Bissalanca em 1971

Com base na análise documental de registos individuais de voo, foi possível identificar a presença do “4711” em pelo menos oito destes destacamentos no período referido, tendo o avião, no qual fazia parte da tripulação o Capitão Piloto-Navegador Augusto Vieira Saramago, descolado da BA6 no dia 14 de Fevereiro de 1970 para o seu primeiro destacamento. A última presença do “4711” na Ilha do Sal ocorreu em Julho de 1973, com o voo de regresso à BA6 efectuado no dia 29 desse mês, tendo aos comandos o Coronel Piloto-Aviador Joaquim Marinho.
Um destacamento típico envolvia voos ferry directos Montijo-Sal e Sal-Montijo, com duração de aproximadamente nove horas de voo. No entanto, algumas vezes, estes voos eram efectuados com escala num ponto intermédio (Porto Santo, Lajes ou Gando). Os destacamentos na Ilha do Sal eram intercalados com períodos de presença em Portugal Continental, sendo estes aproveitados para se efectuarem as necessárias inspecções periódicas programadas.
De referir que estas inspecções dos P2V-5, ao serviço da Força Aérea, eram realizadas às 60, 120, 180 e 240 horas de voo. Os tempos previstos de imobilização da aeronave para se cumprirem estes requisitos de manutenção variavam de um dia (inspecção intermédia de 30 h, efectuada na “linha da frente”) até 18 dias (inspecção das 240 h).
Tripulação de P2V-5, na BA6 (Montijo), em meados da década de 1970, envergando fatos de voo de alta visibilidade em ambiente marítimo




Por: Mário Diniz e Dr. Luís Proença.
Texto extraído da Revista Mais Alto

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