quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

VISITA À SANZALA


Pouco mais de uma semana havia passado desde que tinha pousado em Luanda, depois de umas 18 horas no DC-6 vindo de Lisboa. 
Estava agora em Henrique de Carvalho, na AB 4. 
Lá, encontrei um meu camarada da recruta, o Lopes (nome fictício para salvaguarda de identidade) que, dois dias depois, em conversa com mais outros, disseram que iam à sanzala e fui com eles. 
Depois do jantar, já lusco fusco, saímos da base, apanhando boleia de uma viatura militar. Depois andando por um caminho de terra batida, fomos em direção à aldeia indígena, a poucos quilómetros.
Começaram a aparecer as primeiras cubatas, casas feitas de paus e argila, cobertas com folhas de árvores e capim, ou chapas de zinco enferrujadas. A entrada era pequena e como porta havia panos ou esteiras, que ofereciam um pouco de proteção do frio ou calor, conforme a altura do dia. As que tinham a porta aberta, eram escuras no interior, vislumbrando-se às vezes uma luz alaranjada, vinda de uma pequena fogueira ou vela.


À medida que avançávamos para o interior da sanzala, o cheiro nauseabundo ia-se sentindo cada vez mais, temendo que o meu jantar fosse desperdiçado.
Agora que já fazia noite, só se apercebiam vultos a passar por nós, eu completamente desorientado. Felizmente os outros já eram veteranos deste local e sabiam bem aonde iam. Parámos em frente de uma cubata e o Lopes, o mais experiente e arrojado, berrou para o interior e saiu de lá uma mulher de idade indescritível que o saudou com “moyo”, o olá da sua língua. O Lopes perguntou pela jovem que normalmente atendia a freguesia de militares na sua cama e a mulher, sua mãe talvez, disse que não estava ali nesse momento. Nunca vira o Lopes tão furioso. Talvez porque me queria impressionar com os seus ares de homem que manda, ou por lá que fosse, começou aos gritos a dizer à mulher que fosse buscar a puta que ele conhecia pois tinha aqui clientes à espera. Claro que nesta altura, o Lopes já havia emborcado uma série de cervejas no bar e mais umas quantas que tínhamos trazido para o passeio.

Com olhos azuis, que mesmo a sorrir pareciam sempre sérios, ele podia ser um bom camarada em trabalho, mas, naquela ocasião era, para mim, a figura odiada do branco sem escrúpulos, sentindo-se superior na raça e na posição de poder que uma farda confere.
Como dali não levávamos nada, prosseguimos para outras palhotas mas, infelizmente para ele, felizmente para mim, não houve mais ação na cama para ninguém e voltamos à base. 


Por: Álvaro Santos Sá



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