sexta-feira, 4 de março de 2016

A OPERAÇÃO NO HOSPITAL DO CAZOMBO

Hospital do Cazombo

Foi um domingo de manhã, eram cerca das 9 horas no Hospital do Cazombo, uma experiência nova. 
Havia um alferes médico que tinha a especialidade de cirurgião, que se via na contingência de fazer uma operação que nunca tinha feito, uma histerectomia, ou seja retirar o útero a uma mulher. 
A mulher estava com uma gravidez de 5 meses, mas o feto estava morto. Normalmente nestes casos, o feto é expelido, mas tal não aconteceu e o feto estava a contaminar o útero.
O médico nunca tinha feito tal operação e pediu-me para a fotografar para fins curriculares.
Fui ao hospital estudar o ambiente da sala de operações. Desde há muito que era fanático por fotografia nocturna, de modo que tinha comigo dois filtros para correcção, um apropriado para 3200 grau Kelvin o outro para 3600, ou luzes de tungsten. Sorri quando olhei para as lâmpadas e li tungsten, tinha tudo o que precisava. 
Lavei as mãos, vesti mascara e touca, depois limpei a Nikon com álcool e lá vamos todos para a sala de operações, aquilo não devia ser mais difícil que andar na picada ou fazer looping no T6.
Não gostei nada de ver cortar directamente na pele, rasgar a carne e abrir a barriga, depois foi mais fácil.
Alguma dificuldade em separar os ovário do útero, já que estão colados às paredes exteriores do mesmo. Neste tipo de operação há essa opção, a questão era saber também se os ovários estariam contaminados, o médico optou por deixar os ovários, produtores de hormonas, o que facilita a vida e o bem estar da mulher.
Uma anestesista e um auxiliar angolanos, um médico de clínica geral e o cirurgião. O cirurgião tinha que ser instrumentista, operador e orientador geral. 
E a operação prosseguia e eu ia fotografando, foi uma experiência, mas hoje são um testemunho de uma parte da nossa intervenção colectiva. Estamos todos de parabéns, lembrem-se disso quando alguém puser em causa a vossa intervenção naquela guerra, Não foi tudo bem, não foi tudo correcto, os "outros", também não, mas quando alguém faz, os que nada fazem têm sempre algo a dizer.
Sete horas na sala de operações, para fazer uma operação que num hospital devidamente equipado, com equipa experiente demoraria meia hora.
Mas fez-se e fez-se no Hospital do Cazombo em finais de 1972. 
Eu e o médico gostámos do meu trabalho, devolveu-me 4 diapositivos de um rolo de 36, para minha recordação.
Uma vida tinha sido salva, a mulher já tinha 5 filhos.
Foi também isto que andámos por lá a fazer, a salvar vidas.

Por:




Armando Monteiro
Alf.Mil.Transmissões BCaç 3831

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