quinta-feira, 2 de setembro de 2021

AM 44 - BEM VINDO AO LUSO !




Março de 1971.
Tal gigantesco escaravelho, o Nord Atlas, também conhecido como o barriga de Jinguba, fez-se à pista e lá tocou com as rodas no chão. 
Já na placa e com os motores parados, os passageiros saíram da sua barriga. Eram um misto de civis e militares. Entre os civis, havia quem transportasse malas elegantes muito à moda, enquanto outros carregavam os seus haveres embrulhados com grandes nós em panos coloridos tão típicos como os seus donos
De entre os militares, saí eu carregando o saco azul regulamentar, “contendo toda a minha vida” para uma nova etapa da minha carreira militar.
No hangar para onde me dirigi, um edifício térreo e de linhas simples, tratei da papelada entregando a minha guia de marcha e depois segui todo o pessoal para a carrinha que nos levava para o almoço, na cidade, distante uns poucos de quilómetros. Não havia instalações de cantina nem alojamento e essa foi a minha primeira surpresa. Dei em falar com um meu camarada especialista, o Ferreirinha, que me foi informando do modo como se vivia a vida nesta parte do mundo como militar da Força Aérea.

Os oficiais tinham alojamento e alimentação no Hotel Luso. Os sargentos e cabos especialistas comiam no restaurante da Pensão Nobre e tinham de encontrar alojamento, alugando um quarto nalguma casa particular ou havia uma casa alugada por especialistas, a República dos Saltimbancos. 
Tínhamos ajudas de custo para compensar as refeições e o alojamento mas a dificuldade era encontrar um lugar. No entanto, o Ferreirinha prometeu falar aos dirigentes da República, para ver se eu poderia ficar ali alojado. Ele pensava que havia uma vaga. Felizmente havia de facto uma cama livre num quarto partilhado com outro especialista, que de momento estava destacado no Cazombo. Tive assim a honra e privilégio de fazer parte do tão afamado Clube dos Saltimbancos. 
“Amanhã é sábado e vamos ter uma festa aqui em casa com meninas e tudo!” disse um dos companheiros. Era já um bom começo
No dia seguinte fizemos uma limpeza geral, fomos buscar cerveja e comida e ao fim da tarde estava tudo pronto para a festa. 

As “meninas” foram entrando e depois de algumas Nocais, a minha cerveja favorita, até eu me juntei na dança, música africana com certeza, a tocar no gira-discos. 
Faz-se noite cedo nestas partes de África e estava definitivamente escuro quando a festa começou a esmorecer. O número de anfitriões e convidadas começou a diminuir quando um dos meus companheiros me disse que, como já passava da hora do recolher obrigatório para os locais, diga-se, uma das raparigas teria de ficar a dormir no meu quarto. Isto suou como um alarme na minha cabeça, mas não perdi a compostura e aceitei a informação como se fosse coisa que eu fazia normalmente... 
Ora, os corpos suados, destilando cerveja e transpiração, num pequeno quarto com a porta fechada, não conduziam a uma cena muito romântica, que se avizinhava. O meu estimado frasco de Old Spice, a água-de-colónia da moda, foi a minha salvação e dentro em pouco o quarto tresandava a perfume. Fora esta a iniciação do rapazito a adulto, do soldado ao interior de África.

Bem-vindo ao Luso!

 

Por: Álvaro Santos Sá



1 comentário:

  1. Boa tarde. Gostaria de saber como contactar o responsável pelo vosso blooger .Saudações.Manuel Neto

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