DT - Chegaste à Força Aérea em 3 de Maio de 1966. Quando aplicaste para o Curso de Amanuenses uma pequena mentira na aplicação ia estragando tudo. Podes falar deste pormenor?
FS - Sim, estava a preencher o formulário inicial para provas físicas e testes de avaliação na BA3 em Tancos e tinha feito amizade com um indivíduo de Barcelos, que me disse que pusesse que tinha experiência de escritório e contabilidade e eu assim fiz. Depressa descobriram que não era verdade, despacharam-me para outro lado. Ali a maioria sabia tudo, alguns escreviam à máquina quase de olhos fechados.
Mas havia a possibilidade de um tempo de aprendizagem na arte de escrever à máquina, fiz por isso. Na parte física não havia problema, agora o resto tinha de conquistar e dediquei-me. Aprendi a escrever à máquina. Nas provas de avaliação quem tivesse menos de 10, passava pelo barbeiro e recebia guia de marcha para o Exército. Não passei por essa vergonha, a minha nota foi 13.5 e o máximo era 15.
Entretanto tirei um curso rápido de "Intendência de Messes" e comecei, na Esquadra de Radar nº.12 em Paços de Ferreira, a ser responsável pelas compras para o abastecimento da Messe. Transformei aquilo num ‘super hotel’ e ainda houve tempo para jogar no Paços de Ferreira até à altura de um acidente me mandar durante um mês para o Hospital Militar no Porto, após um treino no Estádio das Antas, a pedido de Virgílio Mendes, antigo jogador do Porto e ao tempo meu treinador no Paços.
Depois mudei de ideias e pedi para sair da Esquadra de Radar em Paços de Ferreira. Mandaram-me para a Secretaria de Estado da Aeronáutica em Lisboa, mas aquartelado em Monsanto, fartei-me depressa…
DT - E surgiu-te a ideia de te aventurares a ir para Angola onde passaste a ter outras responsabilidades, não foi?
FS - Pois foi assim mesmo. Ofereci-me para ir para Angola. Cheguei à base do AB4 a 25 de Abril de 1967. Decidi-me pelo AB4 a conselho de alguns companheiros.
O AB4 era um Aeródromo pequeno, com muito pouco pessoal, em Henrique de Carvalho, na zona leste nas chamadas terras da Lunda.
Deram-me a possibilidade de amoldar a secção de Tesouraria e Vencimentos, com a responsabilidade de Cantinas, Messes, pagamentos de Subvenções para familiares na Metrópole, descontos para os Serviços Sociais das Forças Armadas e mais uma data de coisas. O serviço era feito antes por dois indivíduos da Polícia Aérea, havia para ali montes de problemas. O chefe daquilo era um Capitão ainda novo formado em economia que me disse: “tu vais separar esses dossiês e organizá-los”. Fiz o que podia e o que sabia, que já nessa altura sabia muito, e assim fiquei à frente da secção de Tesouraria. Depois rebentou a guerrilha na Zona Leste, começaram a aparecer reforços, em pouco tempo já éramos uns seiscentos. No meu serviço de vencimentos e tesouraria entraram mais seis elementos, dois oficiais e quatro sargentos. Os meus chefes, o Capitão Lobo da Fonseca e o Segundo Comandante Aníbal Pinho Freire, fizeram notar que ali não havia postos mas sim a qualidade do trabalho, mas os tipos não queriam responsabilidade, eu estava cansado, era muito trabalho, em certos dias obrigavam-me a dirigir toda a organização de defesa da base e às vezes os paióis, foi assim no 10 de Junho, Natal, Ano Novo e Reis. Mas, a verdade é que aqueles gajos pouco se importavam e iam dormir sempre descansados…
DT - E há um facto curioso, tu fizeste parte de uma equipa que fez a primeira investigação à corrupção na Força Aérea. Podes recordar?
FS - Foi um trabalho exaustivo e eu participei nele com o Coronel João da Cruz Novo, que era o Comandante da Base, o Cap. Lobo da Fonseca e o segundo Comendante Major Aníbal de Pinho Freire, mais tarde General Freire, e que terminou com sete anos de prisão para os tipos que chefiavam as compras para a Cantina e para as Messes. Sinto-me orgulhoso por ter feito parte desta investigação.
Foi na Força Aérea que a minha auto-estima veio ao de cima e aprendi que os sonhos são possíveis se corrermos atrás deles, se nos dedicarmos.
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